Liguei para a minha amiga-irmã, também mãe de três, e choramos. Choramos as duas. Por uma hora. Um pouco eu, um pouco ela, de repente nós duas. Nós e as nossas vidas exigentes como mães. Ambas mães de três.

Somos do tipo de mãe que vive as verdades da vida nuas e cruas, junto dos filhos. Protegendo-os como dá, mas nunca à parte delas, das verdades. Mãe do tipo soldado americano. Que carrega bandeira no peito, tatuada no corpo. Como forma de marcar etapas e enfrentamentos da vida. Ou, abrasileirando a coisa, que escreve livro ou se posiciona em rodas de amigos com suas convicções, de forma clara, sem constrangimentos. Mãe do tipo que representa o que é ter e viver a maternidade na sua integralidade, mas não só a ela. Mãe que vive a vida. Que reconhece os erros do caminho a fim de não mais repeti-los. Em terapias de autoconhecimento ou olhando no olho deles mesmo, dos erros. E que ajusta o avião em curso. Que empilha pratos para não faltar com ninguém. Mas que é ser humano. Que procura não repetir erros revisados sim, mas que repete comportamentos. Coisas da gente. Que cada um tem, que é do seu ser. E que exigem se reconhecer para pelo menos escolher quem querem ser em cada cena da vida e onde dá para ser melhor que antes. Onde vale o esforço da transformação, além de se acolher. Mas que erra, um monte. E que precisa de ombros, também. De ajuda e de colo muitas vezes.

E assim fazemos as duas. Uma maratona. Com o amor novo que recebemos da vida e com quem construímos recomeço. Com os filhos, que são três, e com quem dividimos cada milésimo de segundo, cada resto de energia, cada gota da imensidão de amor de mãe que corre da cabeça aos pés. E por incrível que pareça, com nós mesmas. E isso é uma conquista. Que identificamos uma na outra, na construção das nossas novas famílias. Que passamos a colocar na nossa equação do dia a dia. Nós, enquanto mulheres. Nós, e os nossos sonhos. E por isso, choramos. Porque ser tudo estufa o peito, faz feliz em mais de um caminho, em mais de um papel, mas às vezes, é muita coisa para uma pessoa só.  Exige muito trabalho, em cada relação. E faz tristezas também, pois nem tudo são flores.

Como é bom ter com quem chorar as dores do crescimento. Da expansão. Com essa amiga, faço isso. Há uma vida…. Mas o que quero trazer aqui, e que também nos aproxima, é essa questão complexa, exigente e tão intensa que é ser mãe, e mãe de uma nova família.

É maravilhoso poder, enquanto mulher e amante, ser mãe. Ser amplificada dessa forma gigante em emoção, ao ponto de gerar, amamentar, acordar à noite, ver crescer, e depois, ver fecharem a porta do quarto para seu “momento particular…” e respeitá-lo.

Momento particular? Pode isso? Como, se o meu de mãe é tão regido por eles, os filhos!

Não pela falta de capacidade de dar as cartas quanto a hora de cada coisa e de cada um na vida familiar. Se tenho outras vidas hoje, é porque consegui equilibrar coisas e tempos…. Mas porque, se precisarem da mãe, corro para eles. Não é assim com a maioria das mães? De salto, da reunião, do restaurante, da cama. Da dança com o amor da vida. Aquele pelo qual procuramos por ela toda. Até aqui. Porque é assim a maternidade, intensa e inteira. Como em nada antes deles chegarem.

Por este motivo, seria maravilhoso ter tudo sob meu controle e assim, por conta de uma agenda impecável, não faltar com o que para mim é principal. Queria sim controle total, pronto falei. Mas reconheço que as coisas não estão na minha mão. Que não domino nada, nem qualquer dia ruim, e nem mesmo o puerpério pelo qual passo agora. Nem as lágrimas vez ou outra. Então, choro mesmo de vez enquanto. Por reconhecer que não dou conta.

E a gente não dá. E nem precisa. Aceitar essa realidade dói, mas dói menos do que não a reconhecer.

Esse senso de poder, onipotente e onipresente, se parece muito com o papel de mãe, mas não é. Acredite. Somos mulheres poderosas sim. De fato, capazes do inimaginável pelos filhos, e depois que eles nascem, pelos maridos e por nós mesmas, já que a maternidade dá forças ao nosso ser como um todo. Mas somos seres humanos, e o que quer que tentemos ser na vida, entendo que precise ser construído. E mesmo assim, não daremos conta de tudo sozinhas.

Pois bem, no meu auge do papel de mãe, com uma filha de nove, um filho de sete e uma bebê de quarenta e cinco dias, mais uma casa, um amor, um site para o qual amo escrever, e uma empresa para a qual dou as minhas espiadas em meio a minha licença maternidade, confesso que nunca precisei tanto me acompanhar. Nunca demandei tanto do meu parceiro. Nunca quis tanto a minha mãe por perto, ou as minhas irmãs. Nunca desejei tanto os telefonemas de uma hora com essa minha amiga-irmã. Porque neste momento, no qual tudo o que eu amo me demanda muito, transbordei algumas vezes. Não dei conta. Precisei dividir, para o equilíbrio da minha saúde emocional. E o que me ajudou a não adoecer foi reconhecer. E pedir ajuda. E assim, entender, a cada dia, as minhas capacidades e os seus limites. Na construção da mãe e mulher “possíveis” que posso ser.

Há alguns dias assisti a minha sogra, na nossa despedida de um final de semana em Santa Maria, abraçar a minha bebê, sua mais nova neta, e chorar. Chorar pela saudade que sabia que iria sentir a partir daquele momento, daquele abraço. E agarrada, como se agarra uma chance, mais que isso, uma vida, sofreu para deixa-la ir para casa. A tão desejada Antonella.

Ali, naquela cena, percebi o tamanho da força que construí dentro de mim, como mãe de uma nova família, nestes últimos anos. Porque me despeço dos meus filhos, sem outra alternativa, somente a que tenho pela escolha que fiz, desde os seus quatro e cinco anos. Os entrego de malas nas mãos, pequenos, já fazem três anos. Me despeço de filhos pequenos. Ainda dependentes e indefesos para tantas situações da vida, que podem ocorrer longe dos meus olhos controladores de mãe. E naquele minuto, no choro daquela avó, senti o tamanho da mãe que precisei construir neste tempo sem me tornar uma bruxa conceitual. Sem abandoná-los. Sendo mãe mesmo, longe e perto. Aprendendo com cada adeus. E peguei este tanto de valor, de força, e guardei no meu coração. Na prateleira das energias. Daquelas que alimentam a autoestima desta mãe que me tornei. Esta que me fez a mulher que sou hoje, que me fez mãe de três. De uma família diferente, mosaico, que me exige toda a minha criatividade, doçura e fortaleza, os quais exige o papel de mãe de uma nova família.

Este que fez nascer a máxima de que “mãe é mãe”, de que não há nada igual. Este papel poderoso, que nos faz capazes deste exercício tão altruísta que é gerar filhos, cria-los, educa-los, acompanha-los por toda a vida e em parte dela, apenas com os olhos e com o coração. Deixando-os viver as suas histórias e assisti-los da plateia, sem envergonha-los, sem fazer cena, mesmo sendo eles personagens principais da nossa. Mesmo que pertençam os três, no meu caso, ao meu palco.

Então, como diz o poeta, “padecemos no paraíso”. E para que essa experiência não signifique nunca sofrimento, melhor saber que não darás conta. Que precisarás de ajuda. E que é melhor pedir. Para quem for. Pois ninguém nunca está sozinho. E não há nada melhor do que estar acompanhada, em qualquer empreitada. Principalmente nesta.

Obrigada amiga-irmã por não me faltar. Pelo exemplo de mãe de uma nova família que és. Vivemos questões realmente exigentes, e uma na outra sempre encontramos abraços, alternativas e uma amizade sem fim. Obrigada mãe por andar comigo sempre e pelo olhar acolhedor que tens às novas famílias, mesmo sendo parte de uma tradicional. Grata ao meu marido, que me fez mãe pela terceira vez, o que me faz tão feliz. Os demais, estão todos aqui, no meu coração. E assim, sigo acompanhada na vida. Sigo intensamente, mãe.

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