Pela sugestão de uma amiga querida e sensível, assisti neste final de semana ao filme “A caminho da lua”, da roteirista Audrey Wells, que está no Netflix. À convite dela também, o meu desafio era o de comentar a nova formação familiar da protagonista, da menina Fei Fei, já que navego por este assunto há alguns anos.

Fui além, afinal não sei ser objetiva. Então está aqui um “texto reflexão”.

Primeiro, acho importante trazer que a minha percepção é a de uma mulher que compõe uma nova família, com uma configuração rearranjada, e só. Não sou uma especialista, mas uma pessoa atenta e aberta. Que se propõe a pensar e “comentar” os formatos familiares e os afetos porque os vivencia e os assiste de perto, com acolhimento e liberdade.

Dito isso, acho que posso comentar agora:)

Assisti ao filme como deu… da forma possível. Antonella, minha filha de dois anos e meio, e Joana, minha filha mais velha, de onze, foram minhas céticas companheiras. A primeira ainda não tem concentração e tranquilidade para permanecer sentada frente a uma obra cinematográfica de uma hora e quarenta. A segunda queria outras opções de filmes com enredo mais “adolescente”, mais a “praia dela” do momento. Mas eu estava ansiosa por assistir, por tudo que li e ouvi a respeito.

Para comentar precisarei contar um pouco… A história se baseia na busca de uma menina por uma prova de que o amor é infinito, de que ele dura para sempre, após a perda da mãe e o desejo do pai em reconstruir sua vida com um novo amor. Neste caminho, ela entende que a forma mais viável de constituir prova ao pai, de forma que o fizesse desistir do seu recomeço, seria ir até a lua comprovar que a deusa das histórias que a sua mãe contava realmente existia e que ela aguardava, lá da lua, pelo dia em que voltaria a encontrar o seu amor, aquele prometido para a vida toda.

Sob a ótica do pai, nascia em sua vida o desejo da reconstrução. Do novo amor e da possibilidade de seguir em frente após a despedida de sua esposa, mãe de sua filha. Sob a de Fei Fei, o pai deveria esperar o reencontro com a mãe por conta daquele amor “para sempre” um dia prometido e vivido, seguindo assim, apenas os dois, até o fim, até que esse dia chegasse. Sob a ótica dos familiares, do entorno, a reconfiguração da família deles seria o caminho natural que aos poucos a menina iria se adaptar, mesmo que alguns estivessem mais conscientes disso do que outros. E na minha ótica, o filme retratou de forma muito fiel o que acontece em tantos casos de reconfiguração familiar: filhos que muitas vezes sofrem e resistem às mudanças da família, pais amedrontados pela aparente dimensão do sofrimento deles, e um caminho de amadurecimento e experimentação até a adaptação ao novo. Quanto ao entorno e envolvidos, aprendendo a lidar, sendo uns mais hábeis que outros neste processo. E os sonhos e idealizações, de repente ressignificados, assim como o amor e a felicidade.

Minha filha Joana viveu a separação dos pais e a formatação de uma nova família para nós aos seus cinco anos. Não viveu o luto pela perda de uma das suas “torres de luz” de forma definitiva, do pai ou da mãe, mas viveu a morte da rotina, do dia a dia, e do livre alcance aos dois que o formato tradicional possibilitava. Então ela se tocou. E percebi que não foi pela morte da mãe da menina, mas pelas cenas de amor e cumplicidade entre os seus pais, juntos, que ela não veria mais. Joana sentiu pela menina, sentiu por si própria, sentiu pelo amor perdido. Afinal, aquelas cenas pareciam algo ideal, e talvez até seja. Mas vamos fazer um parênteses aqui? A vida não sai exatamente como idealizamos e nem a idealização garante o “felizes para sempre”, fecha parênteses. E naquele ato me questionou sobre a felicidade oriunda das relações de amor. Se ela existe, pois não a vê daquela forma idealizada no dia a dia da gente, dos seus pais, seja na casa que for.

Este é o primeiro “highlight” que trago sobre o filme. O amor idealizado pelas crianças e que em tanto é alimentado pelos adultos. Na mesma hora pausei o filme para esclarecimentos entre eu e ela quanto a felicidade no amor. Não se é feliz com tudo e com todos os momentos, nem em todos os dias nossos. A vida em família é exigente e nem sempre estamos trocando olhares apaixonados, carinhos e delicadezas com os nossos amores. Estou mentindo aqui? Os relacionamentos, para serem reais, sadios e passíveis de felicidade, precisam ser debatidos, ajustados, alinhados a todo o tempo. Possuem intercorrências, dias ruins, divergências e nem por essas deixam de ser amor ou possuir, na sua essência, nutrição pelos seus momentos de felicidade. E as cenas de amor expostas através do carinho entre seus pais eram a base do “amor para sempre” de Fei Fei, e de certa forma, morava no ideal da minha filha Joana também.

O outro “hightlight” que eu traria aqui se refere ao medo do novo, das novas possibilidades de relações íntimas e de afeto. Ele permeia a vida de todos da história, mas, principalmente, a da menina, uma criança… Tenho claro que inicialmente o medo parece maior nas crianças pela forma como o enfrentam. De um jeito simplesmente vulnerável. Seja pela atuação em seus comportamentos ou pela explicitação clara do que os amedrontam, as crianças deixam “transparente” o fato de que o medo existe e que os perturba. Fei Fei estava com medo de enfrentar a perda da mãe e a realidade de que ela não voltaria, de que a vida não seria mais como antes, de que ela e seu pai viveriam transformações dali para frente. Ele, o pai, também estava com medo. Afinal, a preocupação de como a filha se adaptaria a nova vida, agora com uma nova família, permeava seu semblante durante todo o filme, o que era perceptível mesmo em desenho animado, e que só se alternava com o evidente desejo que continuar… Alguma semelhança percebida aí no seu coração e na sua história?

Voltando aos “highlights”… À parte a fantasia bonita oferecida pelo filme nos voos de foguete conduzidos por crianças e no show a lá “Katy Perry”, performado pela então “deusa da lua”, a moral da história para mim eu trago no título deste texto: “só há um jeito de acalmar a dor… se abrir para o amor”. O ponto alto deste filme bonito, o motivo que Fei Fei encontrou como viável para continuar, para acolher as novas possibilidades da vida, sua nova constituição familiar, os frutos desta nova formação, as possibilidades de amar de novo…

Tudo o que é da vida e sobre o qual é importante conversarmos, esclarecermos, acolhermos e orientarmos no que tange a nossa responsabilidade como pais de abastecermos nos nossos afetos, nas nossas crianças, as formas possíveis de dor, de amor e de felicidade na vida, que são muitas. Permitindo assim que questionemos juntos, em família, a idealização de caminhos que de certos, reais e seguros não tem nada, além do fomento à certeza de que o amor na gente não faltará, mesmo nos maiores desafios. Como os de Fei Fei e o das famílias que vivem a reconstrução por força de um divórcio, por exemplo.

E se valer a opinião sobre o amor “ser para sempre”, aproveito a deixa para lembrar do tanto que escrevo aqui sobre o assunto: o amor que é vivo e nutrido na gente, seja por quem for, vive eterno. Demanda ser trabalhado dia a dia, pois o jogo não está ganho nunca, nem para ninguém. Mas se exercitado, pode amar a muitos e a nós próprios, infinitamente, pois nascemos para amar a final de contas, e para recomeçar…

Agora, sugiro que se você for prometê-lo a alguém, prometa a si mesma. Essa é a maior e mais real possibilidade de você cumprir a promessa e de provar aos seus que o amor pode ser para sempre, sim.

Camila, querida… acho que é isso ❤

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