Após a minha separação do pai dos meus dois filhos, conheci a pessoa que se tornou meu marido. Para muitos conhecidos e familiares foi um movimento rápido demais, mas enfim, foi como tudo aconteceu para mim. Sempre respeitei a mim, aos meus filhos e com a maturidade, aos meus sentimentos. E foi com esta convicção que eu trouxe à minha vida e das crianças o meu novo parceiro, o meu amor.
Como já contei em alguns dos meus textos, a sinergia deles foi bárbara e logo se tornaram uma família. Criaram laços tão honestos, tão bacanas, que olhá-los constituía a maior prova de que eu estava trilhando o caminho certo. Enfim, o meu caminho. Só que a separação era recente e estávamos todos em adaptação àquela nova vida quando meu ex-marido conheceu o homem que estava assumindo a posição ao meu lado. De namorado, de marido, de amor. De padrasto das crianças. Dos seus dois filhos. E não foi fácil.
Posso falar pelo nosso lado. Daquela família que estava se formando ali, diferente. Meu marido não tinha a pretensão de substituir o pai das crianças. Nunca teve. Sua relação com eles foi se desenhando como a de um superamigo, marido da mamãe, e que muitas vezes dividia com ela as funções e responsabilidades da casa, assim como de cria-los. Foi uma escolha dele quando chegou. De entrar com os dois pés. E com muito respeito. Então ajudou em tudo. A fazer o tema, a servir a janta. A cortar a carne, a amarrar o sapato. A treinar chute a gol, a andar de patins. A posicionar “erres e esses”, a respeitar os mais velhos, a comer de boca fechada. Trabalhou comigo, todo o tempo. E isso foi realmente uma escolha maravilhosa. Para mim, que tinha um parceiro na tarefa diária de cria-los e amá-los. Para ele, que pode participar de verdade daquela família. De ser parte e não, à parte das nossas vidas. Mas principalmente para as crianças, que o tinham como parte nossa, não como o namorado ou marido da mamãe. Que tinham mais dois braços, mais um abraço e um coração. Ali, para atendê-los. E este movimento, lindo, era inicialmente desconfortável para o pai.
Não me atrevo aqui a falar por ele, de jeito nenhum. Mas falo pela situação toda de adaptação que vivemos e da qual fiz parte. Estava ali. Todo o tempo. Olhando nos olhos deles, construindo aquele presente. E por muitas vezes, no largar e buscar de crianças e malas, nossos momentos foram hostis. Era difícil para os dois. A dificuldade não estava nas palavras, apesar de em algumas vezes terem sido ditas, longe das crianças. Mas estava no ar. Que todos respirávamos ao nos vermos. Juntos no mesmo ambiente. Na nuvem das crianças. Aquela nova família, aquele modelo diferente. Ou nos telefonemas atendidos, nos dias de febre. Quando medicava uma criança enquanto o homem que estava ali, ao meu lado, me assistindo de todas as formas, atendia e relatava a situação ao pai. Na noite que não era dele.
E sem saber, eles compartilhavam aquelas duas crianças. Compartilhavam o crescimento deles, os ensinamentos dados. E vez concordavam em suas verdades, vez discordavam. E o processo bonito de fazer melhor pelo outro, no nosso caso pelos pequenos, começou a acontecer. Passo a passo.
Certo dia, minha filha mais velha, e tão perspicaz, percebeu a dificuldade deles. Como sempre, verbalizou a nós. E o que mais a machucava era a possibilidade deles, seu pai e seu padrasto, nunca serem amigos. Daquela relação aparentemente hostil para ela, ser para sempre. Lindinha… Com sua clareza e esperteza sempre amoleceu corações. E naquele momento estava, delicadamente, cobrando aquilo deles. Que se dessem bem. De nós como família. Que fossemos todos amigos. Porque só o que ela queria sentir na sua família, do jeito que fosse sua modelagem, era paz. E na paz, não haveria culpa de amar.
Aquilo era um pedido inocente, que nos tocou nas profundezes. Que tocou àqueles dois homens. Que assisti acontecer e transformar. E que fez, em algum momento, darem um passo em direção ao outro por eles, pelas crianças, sem perceber porquê. Porque os “porquês” deles tinham nome. Se chamavam Joana e Joaquim. E já faz mais de dois anos.
Um domingo desses, o Fantástico exibiu duas matérias sobre casais divorciados e filhos. O que me gerou felicidade plena por perceber que de alguma forma está sendo colocada luz sobre este assunto. Sobre este processo doído do qual muitas vezes fazem parte os filhos. Este legado que não acaba com o fim do casamento. Que precisa de condição para continuar. E que estava sendo tratado com cuidado, em rede nacional.
E aí deixei acontecer. Permiti que Joana e Joaquim, interessadamente, assistissem. E atentos, olharam aquele processo, da separação de pais. E viram acontecer com personagens da TV da nossa casa. Se permitiram assistir outros casos, outras formas de fazer, outros problemas. Assistiram o divórcio transformar outras famílias. E completamente hipnotizados, começaram a se aproximar, a se juntarem a nós, mais pertinho, e mais pertinho.
Então a matéria acabou. Joaquim se abraçou no seu padrasto, com quem divide as experiências da vida de menino, inclusive as vividas nos dias do pai, e foi para a cama para um início de noite de conchinha. Joana se aproximou lentamente de mim. Seus olhos verdes sorriam. E foi ali, na cozinha, que cochichou comigo sobre a sua sensação. A que tinha agora. A que chamou de paz. De ter sua família bem. Junta, em casas separadas. Que construiu a sua forma de compartilhar o que era de todos. Todos que tivessem o que dar. Àquelas duas crianças. E o aprendizado tão humanizador da nossa história. Sobre compartilhar.
Comentários
sempre lindo!! encantador!!
Ju, me emociono sempre quando leio tua se historias, porque são nossas também! Parabéns pela coragem de expor esse momento único que estas vivendo! Saudades! Bjao
Gente que coisa linda!!!
Fico emocionada, pois vivo este momento delicado também, e torço para que toda esta nevoa se transforme em paz!
Delícia em reafirmar que, como penso, não precisa ser tragédia. Que pode, sim, acabar tudo bem! Pai e Mãe continuam alí, elo para se obter o melhor adulto possível com valores de família -real-
Grata por ler este texto, que aliás, amo todos!!!
bjo
Magna