Assim como monossílabas, dissílabas, trissílabas e polissílabas determinam palavras de uma, duas, três ou “mais de três“ sílabas, trago, por conta de um sentimento diferente e estranho para mim, definição parecida para as qualidades de mãe. Mãe de um, de dois, ou de “mais de dois”, no caso, uma “polimãe”. Vivo neste momento a experiência de uma “polimãe”. Completamente diferente de ter dois filhos, completamente diferente do que eu imaginava e para o que estava preparada. Porque me sinto saindo do individual para o coletivo.
Deixa eu tentar explicar melhor, porque não é simples…
Os enxergo, meus filhos, indivíduos como antes. Não se trata de empacotar a condição, não. Mas nos entendo um coletivo, algo muito maior do que antes, algo espalhado. Parece confuso? E é. Porque é como se eles ficassem maiores do que eu, suas existências. Afinal, todos cabem no meu coração, mas não no meu colo. Não juntos nos meus braços….
Pois bem, acho que agora me fiz entender. Isso define. Minha família saiu do meu controle físico e por consequência do emocional, pois não os pego mais um em cada braço. Não é mais um para um, nem eu, com dois braços e dois colos, para dois filhos. Agora somos eu e o meu amor, pai desta família, para três. Sou eu mãe, para três filhos demandando mãe. E aí, inevitavelmente eu falto. Falto para alguém. Faço algum abrir mão e esperar, ou quando a coisa não funciona tão bem assim, coloco a ordem e defino eu quem espera, quem fica no “ferrolho”. Até aqui falo dos filhos… mas tem também o marido, o amor, a parceria. Esse também tá no coletivo, também vai para a fila. E na nossa constelação, com a chegada da nossa linda Antonella, pela qual estamos apaixonados, entramos todos na fila uns dos outros. Viramos uma grande feira.
Parece fácil quando planejamos, mas não é. Tem uma mudança profunda que acontece quando viramos um coletivo, nos termos que exemplifiquei. E de maneira nenhuma é ruim, não me entendam mal. Ao contrário, tem a sua leveza…. Mas é de fato uma mudança radical de vida e conceito.
Conheci um médico no Hospital Moinhos de Vento, onde trabalhei, que dizia o seguinte: o mundo foi feito para famílias de quatro pessoas. As mesas dos restaurantes, os carros, os apartamentos, os braços. Tudo pensado para atender confortavelmente uma família de dois filhos. Pensem… faz sentido se pensarmos que fica fácil dividir funções e estabelecer parcerias nas atividades diárias da rotina de uma família quando estamos em um para um.
Carros para 7 lugares, pensando em conforto para uma viagem, em evitar brigas não os empilhando no banco de trás, e considerando uma acompanhante eventual…. Para estes o mercado oferece poucas opções e de alto custo. Isso sem falar no design, que fica em segundo plano, já que quem precisa de espaço, tão raro entre as opções de carros, não pode se dar ao luxo de querer ainda que seja lindo. Mesa de restaurante passa a ter que ser redonda. As quadradas não servem mais. Retangulares deixam um dos cinco isolado, sem parceria, e aí ninguém quer. Mesa para cinco, espera mais tempo. E para viajar… até duas crianças dá para acomodar em um quarto normal de hotel, com camas auxiliares. Com três, dois quartos passa a ser a única e mais onerosa solução. Mas enfim, o médico estava de certa forma certo, e de fato nossa vida ficou mais prática pela falta de alternativas que uma família grande tem. O que para mim é só engraçado, mas de jeito nenhum ruim.
Sonhei a vida toda com uma família grande, de pelo menos quatro, e hoje sou presenteada por ela com um clã de cinco. E isso para mim é só felicidade. Adoro mesa cheia, carro grande, casa alegre, conversas em família nas refeições. Amo tudo isso. Mas como mãe, vou dizer onde a coisa toda ficou um pouco desconfortável… não nasceu outro braço em mim. Continuo com dois. E agora, aquela mãe super protetora, atenta ao extremo, mãe amiga, falta pelo menos para um. Não dou conta de três ao mesmo tempo. E foi aí que nasceu uma “polimãe”. Uma mãe Freemont 7 lugares, uma mãe mesa redonda. Que se expandiu. Que é grande, e por isso não escuta os cantinhos da sua família. Não acompanha tudo. Pois cria uma turma, uma equipe. Mais de duas crianças.
Mas enfim, é uma mudança de cenário, de roteiro, que só exige mais de mim. Porque nessa nova trama, somos mais. Fugimos aos olhos. Dividimos o mesmo tempo entre muitos. E por isso, precisamos de qualidade. Para que cada momento, com cada um, seja profundo, verdadeiro, embriagante ou, pelo menos, suficiente. Exige, na verdade, de cada um. Novidade para quem só recebia e passou a ter que pedir seu espaço, seu pedaço do bolo, seu pouquinho no colo….
E aí, certa noite, deitei na cama com meu marido e nos olhamos com uma sensação profunda de expansão, de fortaleza, pela nossa capacidade. De cumprir com a nossa proposta com estas crianças, com a nossa família, ao final de cada dia das últimas semanas. Com a sensação de felicidade nesta rotina que depende tanto da gente hoje, do nosso trabalho, da nossa emoção. Que é maior que um desafio profissional, que as metas comerciais dos nossos negócios, que as tantas ambições que temos no nosso “to do list” de conquistas a realizar. Porque se trata da nossa extensão. De parte de nós. De algo que, ao contrário de todo o resto na vida, não vai passar. Vai só valer mais.
Como já vale hoje, neste pequeno pedaço de mundo que é a nossa casa, a nossa nova família.
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