“Câncer de mama é a proliferação descontrolada das células da mama da mulher, que perdem a capacidade de morrer.”

Produzi este material para um dos canais corporativos para o qual escrevo, a partir da demanda de falar sobre o “Outubro Rosa”. Li, reli e, na ânsia de dividir mais coisas e fazer a conexão linda que este processo tem com os afetos e com a família, o repaginei. Para o New Families. Na verdade, tirei a roupa dele, do texto inicial. Como de praxe, deixei o assunto nu e cru, o que me é peculiar. Porque se trata de um mergulho profundo no outro e em nós mesmos. Nos nossos medos, através da história da amiga. Da colega, da conhecida. E por isso, já valeu revisita-lo. Valeu o trabalho…

Esse câncer de mama é porreta mesmo. São células vivas que perdem a capacidade de morrer. Quanta vivacidade! Células que se negam a desfalecer, por motivo químico, fisiológico, ou seja qual for. Vivem e se multiplicam. Que loucura isso… Enquanto vivem, adoecem a pessoa.

São 58 mil novos casos por ano, na maioria mulheres, que tem 100% mais chance de desenvolve-lo do que os homens. Uma em cada oito mulheres receberão o diagnóstico. Ou seja, ser mulher e estar envelhecendo já é um fator de risco.

Trago este assunto por estarmos vivendo o “Outubro Rosa”, como falei anteriormente. Quando os holofotes estão sobre esta doença que abate este tanto de gente. Este tanto de mulheres. Que não respeita tempo, idade, poder aquisitivo, quantidade de lutas enfrentadas na vida, ou o número de pessoas que impacta em uma família, que fica no risco eminente de perder um ente para a doença…

E que o faz, de janeiro a janeiro. Tendo em outubro, seu momento de glória.

Falar da importância de se tocar, de realizar o autoexame, a mamografia preventiva e a visita regular ao médico ginecologista, todo mundo sabe. Está dito e batido em todos os canais de comunicação possíveis neste mês de outubro. Reforço aqui, é claro, pois os índices deste tipo de cuidado ainda são aquém das expectativas dos órgãos de saúde, e aquém do que nos propomos ainda como mulheres no cuidado a nós mesmas. Mas acho importante trazer junto a este assunto, atitudes positivas. Demonstrações de força e coragem. De quem transforma a experiência da doença em amor. Em fortaleza, em mudança de comportamento. Em redefinição de valores. E nestes casos, se sai melhor. Se desenvolve uma resiliência admirável.

Conheci uma mulher linda em uma viagem a Nova Iorque. Uma brasileira, que com o marido e o filho, toca um negócio próprio, e uma vida fora daqui. Um desafio para qualquer um, em qualquer lugar, e lá, ainda, na condição de imigrantes. Longe da família de origem e dos amigos.

Eis que um ano depois de os ter conhecido, sou surpreendida nas redes sociais por um post dela falando sobre a luta contra um câncer de mama descoberto naquele ano. Sobre a dificuldade de receber o diagnóstico longe do seu país, da sua família, do seu apoio profissional brasileiro. Mesmo considerando que lá, o atendimento é de primeiro mundo. Mas foi um diagnóstico dado em inglês. Nem a língua era a dela. Nem este conforto ela teve. Nem o cuidado empático e humano, peculiar do brasileiro, ainda uma característica positiva nossa. Seu diagnóstico foi dado em um centro de tratamento à mulher, na cidade de Nova Iorque.

Essa bela moça, de um entusiasmo ímpar para a vida, se viu frente a um tratamento de câncer, do outro lado do hemisfério. E como que assistindo a uma novela, acompanhei daqui aflita a sua história.

Em resumo, ela viveu o câncer.

Ela, marido e filho. Mas não só eles. No momento do diagnóstico, apareceram pessoas. Contra a máxima de que em momentos ruins as pessoas somem, no momento ruim dela, nasceu uma nova família.

Falo aqui de novas famílias advindas do divórcio e de outras disrrupções da vida. Famílias e seus formatos diferentes… Estes moldados por acontecimentos fortes e escolhas nossas. Estes que nascem também da doença, da dor. Em conversa com essa amiga, impossível não perceber a nova família que nasceu do seu câncer. E que assumiu novo formato, principalmente no afeto. Amigos brasileiros, amigos americanos, vizinhos… Amigos que não eram tão amigos assim, amigos conhecidos. Todos em uma rede só. De apoio a esta pessoa tão legal. E entraram juntos na jornada da cura, de cabeça.

Em casa, se apoiaram uns nos outros, marido, filho e mãe, que de visita do brasil, se fez presente e otimista sempre. Aquelas coisas de mãe com muito para dar, vocês sabem… Sofreram juntos e se fortaleceram na sua célula familiar. E aí, a nova família, aquela de amigos e conhecidos, apareceu junto e amparou arestas. Detalhes do dia a dia. Com carinho e ajuda. Com amor. Este que se oferece de coração a laços que não são de sangue. E que não precisam ser. Basta bater forte o peito. Basta existir ser humano, existir empatia.

Sempre tive medo desta doença. Sempre questionei quem estaria ao meu lado em um momento destes. Sempre imaginei como lidaria com os meus filhos frente a este diagnóstico. E como seria com meu parceiro e o nosso relacionamento de amor.

Relacionamentos de amo… O tenho com o meu cabelo, e imagino que a maior parte das mulheres, descontadas as crises de autoestima, também tenham. Me imaginei com restrições a exercícios físicos, à exposição às intempéries por conta da medicação e da imunidade baixa, de lenço na cabeça, ou quem sabe uma peruca… Imaginei lidar com a ausência de um ou dois dos meus seios, estes que hoje alimentam a Antonella. Me doeu a experiência desta amiga querida. Me doeu imaginar que tantas mulheres, tantas mães, donas do altruísmo que é gerar filhos, ou mesmo o de ser mulher em tempos sempre de tanta luta, lidando com o deserto se abatendo em seu próprio corpo. O ver seco de vida. E assim mesmo toca-lo em frente. Corpo e mente. Pois como imaginar deixar para trás o amor? Este traduzido nos filhos, no parceiro, nos amigos? Neste tanto de gente que vira família no afeto?

Pois esta mulher que tive o prazer de conhecer o fez. Criou canal aberto com o filho sobre o que estava acontecendo, e o fez parte. E ali, conheceu a incrível capacidade de simplificar o ruim e elevar o bom, tão comum nas crianças. No marido, encontrou base forte, pois com ele também dividiu. E ali descobriu a profundidade que um casamento, uma relação de amor pode ter, pode suportar. Nos amigos teve carinho. Flores, pratos de comida, uma faxina ali, uma companhia para o filho nos dias de quimioterapia aqui. Uma carta, um WhatsApp de manhã cedo para saber do seu estado. Atos de amor. E ali, reconheceu uma nova família.

E com o entusiasmo de uma célula cancerígena, que se nega a morrer, ela também se negou. E usou de toda a sua experiência, mesmo nos momentos mais vulneráveis, para ajudar a outras mulheres através do seu exemplo. Do seu olhar. Humano, doído, mas otimista.

Além de usar a sua página pessoal para dividir cada momento com os seus amigos e seguidores, deu seu depoimento frágil e grandioso em uma entrevista que assisti, aqui no Brasil, em um canal online de notícias e dicas para brasileiros que vivem nos Estados Unidos. A assisti sem seus lindos cabelos, aqueles que conheci no nosso primeiro encontro. À assisti, emocionada em falar de família, de saudade, de medo, de vida. A percebi, lutando. Muito mais linda e forte do que lembrava dela. Porque ali, a vi ter mais vida que o câncer que a abateu. E ali, multiplicou sua vontade de viver, mais rápido que a doença o fez.

A mim, ensinou que esta é só mais uma luta. Das grandes, mas uma daquelas que a vida nos guarda. E humildemente aprendeu o quanto vale aceitar ajuda, abraço, afeto. Um coquetel de amor que salva vidas. Que nos prepara fortes para o outro dia. E este para mim é dos maiores ensinamentos. A maior das coragens. Quando realmente abrimos o coração para receber.

E por Deus, ela recebeu o tanto que merecia desta vida. Muito mais do que poderia imaginar, minha humilde amiga. Mas o que merecem os seres de coração aberto, de afeto. E aí, se vence esse caminho que parece não ter fim, até o diagnóstico de “câncer free”.

Isso para mim é inspiração. Isso é para mim, Outubro Rosa. Ver, além da campanha tão necessária de prevenção, histórias de garra. Ver a vida do ser vencer a vida da célula. Ou pelo menos tentar. Pelo menos lutar. Pois se células malignas podem, porque não um ser benigno?

Minha homenagem a todas as mulheres que enfrentam ou enfrentaram o câncer, através da minha linda amiga Patrícia Beraldi Gonçalves. É realmente um privilégio acompanhar a sua luta e a assistir compartilha-la. É um presente ter a sua amizade. E vê-la gora, dona desta grande nova família de afeto.

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