Essa música toca todos os dias no rádio e eu nunca percebi. Nunca. Juro. Imaginei casais se curtindo ao seu som, eu e o meu marido romantizando em umas férias na praia, mas nunca isso. Nunca embalando uma relação parental. Nunca imaginando nas suas estrofes um oferecimento deles a mim, ou meu a eles. E quando a ouvi, naquele salão da escola, morri de emoção.
Você é mãe, é pai?
Então lê até o final, por favor. A sensação nova vale a pena. De verdade. Te entrega ao que essa letra te traz. Imagina o seu filho cantando para você, e depois me conta o que se passou aí. Aqui foi algo como o “ponto ágape” do amor, como diria o meu amigo Gabriel Carneiro. Daqueles de fazer tremer as bases do afeto que eu aprendi a dar, mas talvez nem tanto a receber.
Quando a gente ama o amor de mãe, de pai, naturalmente paramos de necessitar um retorno deles na mesma moeda. Talvez por ser impossível em via de mão dupla, quando se tratam de posições tão diferentes no afeto, na concepção dele. Uma vez escrevi sobre isso. É daqui para eles e deles para o mundo. Mas talvez também por esse amor ir crescendo com o tempo, ficando autônomo, maduro, e por isso se entendendo livre para um profundo mergulho sem a demanda de ser amado da mesma forma, já que nada se compara à sua “infinitude” ou perenidade. A parentalidade nasce e morre na gente e com a gente, pelo menos nos seres sãos. E por isso seu alimento está no “sê-lo” e “vive-lo”, e não no outro. Não no que possa retornar do filho.
E lá naquele palco, eles olhavam para aquele monte de mães e pais, e com roupas de personagens infantis, aqueles que também foram da gente na infância, começaram a cantar, nos olhando nos olhos.
O meu menino, vestido de Peter Pan naquela noite, ele e mais uma dúzia de amigos, dizia tanto para mim sobre o menino que é! De toda aquela sua energia que não quer crescer, só correr, só voltar para o meu colo depois de cansar. Como eu o entendo.
Mas então a canção começou, e dizia assim… Sugiro apenas que você leia a letra.
“Desejo a você o que há de melhor.
A minha companhia, pra não se sentir só.
O Sol, a Lua e o mar, passagem pra viajar.
Pra gente se perder e se encontrar.
Vida boa, brisa e paz, nossas brincadeiras ao entardecer.
Rir à toa é bom demais, o meu melhor lugar sempre é você.
Você é a razão da minha felicidade.
Não vá dizer que eu não sou a sua cara-metade.
Meu amor, por favor, vem viver comigo. No seu colo é o meu abrigo.
Quero presentear, com flores Iemanjá. Pedir um paraíso, pra gente se encostar.
Uma viola a tocar, melodias pra gente dançar.
A bênção das estrelas a nos iluminar.
Vida boa, brisa e paz, trocando olhares ao anoitecer.
Rir à toa é bom demais, olhar pro céu, sorrir e agradecer.
Você é a razão da minha felicidade.
Não vá dizer que eu não sou sua cara-metade.
Meu amor, por favor, vem viver comigo.
No seu colo é o meu abrigo.”
No meu colo é o seu abrigo? É isso mesmo? Me emocionei demais. Pois o amor retornou à sua forma. De filhos para pais. Para pais, abrigo dos filhos. O primeiro abrigo deles, quando ainda tão pequenos, vivendo esse amor de forma tão integral e exclusiva, tão admirável, e que busca proteção e referências. Tão diferente do que vai ser quando crescerem, quando construírem novos vínculos e novos afetos. Mas tão nossos ali, em uma relação intensa de amor, tão bem descrita pela banda Melin. Aquela que aparentemente falava de romance, ora…
Morri chorando. Se dar conta do tamanho do amor de um filho, publicamente lançado em nossa direção, foi inesperado, considerando seus nove anos. Assistir ao movimento solto deles, a quem dedicamos tanto, trabalho e afeto, é algo gigantesco. Me sentir amada por ele daquele jeito, me fez levitar. Assistir a emoção do pai do meu filho, e do seu pai do coração, à cadeiras de distância, e em nome dele, foi simplesmente ver o universo retribuir às nossas intenções e trabalho afetivo. Ver o quanto o mundo é perfeito, quando nos permite gerar e criar seres humanos, ensinando-os e trocando com eles sobre os afetos e o viver, é simplesmente um privilégio. Pois mesmo que mude no decorrer da vida, será sempre amor. Profundo e abrigo. Sempre lar.
E aí? Essa música entrou no teu lugar mais fundo também?
Preciso confessar que ao acender das luzes, percebi que haviam dividido as turmas e que o meu Joaquim não era nenhum daqueles “Peter Pans” que cantaram a tal música no palco à meia luz. Entrou em uma segunda homenagem, com outra canção, acho que da “Palavra Cantada”, e encantou também. E eu, acreditem, era a mãe mais emocionada do salão e com o filho dos outros! Pode isso? Pode sim. Porque poderia ser o meu, um filho seu, ou a minha Joana ou a minha Antonella, e mesmo assim, faria todo o sentido.
Não é fácil reconhecer um filho no escuro de um palco quando vestiram uma dúzia de meninos de nove anos com a mesma roupa! Então, me perdoem. Estou rindo aqui… Até daquela frase que diz que eu reconheceria um filho a léguas, ou até de costas. Mas ali reconheci o seu carinho, a sua intenção, a sua presença entre aqueles parceiros no projeto de impactar os pais com um carinho direto no coração, e tão genuíno e honesto. Tão de criança…
Mas ok, importa que me senti tocada. E as músicas foram escolhidas por todos eles afinal, e aquela era também uma homenagem para mim, mãe do Peter Pan Joaquim do bloco seguinte, e também para você, que leu essa letra e sentiu a presença do seu filho em si.
Aquela música poderia ser para qualquer um de nós, pai ou mãe, de qualquer lugar do mundo.
Pois é isso que somos para eles, tudo isso. Por um tempo, únicos, mas é muito. E para sempre parte, colo, lugar para voltar, se aconchegar ou mesmo só para abrigar nas tempestades da jornada.
Nunca mais conseguirei romantizar eu e o meu marido ao som dessa música sem pensar naquela noite, sem pensar nele, neles… Não conseguiria. Agora, para mim, ela é mais nossa. Minha e do Joaquim, minha e das minhas meninas, Joana e Antonella.
Minha, enquanto mãe. E dos meus filhos, para os quais sou abrigo. E sempre serei.
Agora, temos uma música nossa:)
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