Deitada ao sol, descansando do meu dezembro exigente de mudanças e ressignificações na vida, no lar, na família e na forma de viver os afetos, fitei as minhas pernas. Pernas de mulher madura.
A pele já não tem o viço de antes, parece que carece de água, da fonte “aquela” da juventude. Sabe do que eu estou falando por observação em outrem ou por semelhança?
Então meus olhos se voltaram para as minhas mãos. Marcadas por veias fortes, herdadas da genética de família, e pela mesma falta de brilho e tonicidade do resto do meu corpo magro. Envelheci, venho envelhecendo. Meu sorriso gera um movimento de traços fortes no meu rosto. Meus olhos estão ilhas cercadas por uma pele funda e cansada. Meu baixo peso parece não trabalhar mais ao meu favor, me fazendo mais “franzina” do que antes, mais miúda. A verdade é que o meu corpo reflete a maturidade da minha alma. A que me mudou até este dezembro, que cresceu nas cenas novas e desafiadoras de 2020, como vem acontecendo nos últimos quarenta e um anos, mas que agora, exatamente agora, soam diferentes. Mais fácil de reconhecer, mais em casa, mais confortável no próprio corpo… Uma maturidade que me fez então não fugir ou recuar dos desafios que a vida vem apresentando. Me levou a questionar apenas, a perdoar e recomeçar, com o coração mais em paz com o “possível”, longe dos “ideais”. Grata pelo que foi capaz de lidar e avançar.
Acho que tem um significado aí nessa palavra… Quem sabe “ser capaz” meça a capacidade de ficarmos em paz naquilo sobre o qual nos propomos a trabalhar sobre? A nos habilitarmos? Ca+paz?
A questão é que o envelhecer traz essa calma, sem dúvida. Essa habilidade de manter a tranquilidade frente às maiores tempestades, a esperar passar… E neste trajeto, admirar até o cheiro da chuva. O envelhecer tirou a velocidade dos meus pés de fugir, mas não a sua firmeza no escolher se ir, ou se ficar. Não a sua base. Com piso mais consistente e consciente, o envelhecer me tirou da fuga, mas não do movimento, não dos recomeços. E mitigou os meus medos. Afinal, só quem viveu um tanto sabe que não se morre de mudança, nem de amor, nem de saudade, nem de tristeza, nem de falta de dinheiro… São todas coisas da vida. Se morre sim, é da ausência de presença. Se morre de cegueira. Se morre de ansiedade. Se morre do que nos tira em fuga da nossa própria vida, da nossa história e dos seus aprendizados inerentes. E assim, se morre vivo, quer coisa pior? Além dessas, se morre, é claro, por estar vivo. Pelo que não temos controle… Então, o que temer, se tanto não é fruto da escolha?
Felizes dos que envelhecem… Dos que somam mais episódios na vida. E como diz o amigo Gabriel Carneiro, neste caminho fica mais fácil compreende-la como o mar onde, “após as arrebentações, fica a calmaria”. Não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe, e bem e mal tem significados diferentes para cada pessoa, assim como surfistas gostam das ondas, e nadadores, ou os mais conservadores, da tranquilidade das águas calmas. Cada um a seu gosto. Cada vida com seu sabor. Cada bem a quem lhe convém, e quanto ao mal, a regra serve também.
Entender o processo da vida é valor da velhice, do tempo. É uma etapa que vem com a “secura” da pele, com a falta de viço, com as histórias captadas pelos olhos de uma alma que viu muito. Que sentiu. Que segue escolhendo mergulhar e perceber. Que aprende como lidar com o cansaço e com a correria, sem deixa-los dominar o que há por dentro ou matar a esperança. Que observa o tempo correr e passa a leva-lo em alta estima. Que movimenta o seu próprio “movimento”, não o dos outros, e o faz como dança sobre os ponteiros do relógio, ao seu ritmo particular, hábil ou desengonçado. Porque tanto faz desde que seu… Que entende que marcas fazem parte dos “utensílios usados”, e que sejam bem usados então.
Bem vindo envelhecimento. Bem vindo pedaço grande de tempo. Bem vindo caminho longo de vida, e não menos importantes, cremes anti-idade e óleos corporais. Bem vindas experiências, as segundas e terceiras, infinitas… Bem vindo 2021. Me sinto hoje mais à vontade com a sua chegada. Menos ansiosa e assustada. Mais sabida de que somos os “presenteados” por estarmos aqui e que, neste lugar, ou estamos para ganhar, ou para aprender. E por isso, tudo faz sentido…
Você vem trazendo uma certa paz, sabia? Algo novo para o meu coração. E, não sei por que, me sinto mais leve, mais feliz, mais calma e mais jovial até… vai saber?
Coisas dessa tal maturidade que descobri luminosa:)
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