Ando rodeada de mulheres acima dos quarenta. Mulheres mães de um, dois, três, e acreditem, quatro. Mulheres que são profissionais, que foram e já não exercem mais, que hoje são outra coisa, que viveram as reinvenções de quem tem estrada. Tenho conversado intimamente com pessoas do sexo feminino, um tanto conectadas, buscadoras de si e de um lugar melhor e mais honesto para seguirem em frente… Enfim, algo aparentemente advindo da maturidade.

Sou uma delas. E para não falar das outras falo por mim e das “esquisitices” que tenho vivido e sentido neste caminho novo, além do movimento nunca antes notado das minhas coxas enquanto caminho. Está, parei por aqui… Ou pesarei na depreciação da “minha casa”, e esse é um hábito que quero deixar para trás. Mas o fato é que sentimentos esquisitos têm me visitado em muitos aspectos.

A possibilidade da morte, de faltar para as crianças, que são muitas por aqui, é um deles. Eles são pequenos e a minha “escadinha” para a terceira filha tem um intervalo de oito anos. Além disso, são filhos de pais diferentes, e me tirou o sono pensar outro dia que se eu faltar eles podem ficar longe uns dos outros, no caso os grandes da pequena. É assustador que, criados pelos pais, eles possam viver em cidades diferentes até, e terem tocadas suas vidas sem a identidade da nossa nova família. É como se eu virasse fumaça, sem ter mantido o “meu lugar” de mãe de três irmãos… Quero também vê-los realizar, escolher seus caminhos, tão desconhecidos para mim ainda, quando do futuro sei pouco e deles nele, quase nada. Desejo estar aqui para isso, e esse pensamento medroso me fez sentir envelhecendo.

Outro pensamento esquisito foi me dar conta de que eu e o meu marido, meu amor, temos tempo contado para vivermos os nossos planos e o nosso afeto. Gente jovem não pensa no tempo que tem à frente, trata a vida como se fosse infinita, e quanto pensei na finitude, senti que venho me distanciando da juventude. São tantos projetos, desejos, viagens e momentos que ainda queremos dividir, eu e ele, que o avançar da idade me fez pensar em quanto de “vida útil”, produtiva, no que tange o sexo, a disposição física para grandes aventuras, a saúde mental para sabermos o que estamos fazendo, e que é tão valiosa quanto fazer, ainda terei pela frente. Deu medo da cabeça querer e do resto não acompanhar, ou da cabeça cansar e a gente não poder viver coisas que eu realmente gostaria, sentidas na íntegra. Tipo o nosso tour por Mendoza, as nossas revisitas, sempre novas a NY, o nosso mergulho por regiões da Europa que tanto sonhamos em fazer juntos e o nosso apartamento de dois quartos com vista, tão sonhado para a nossa velhice, com um carro de dois lugares na garagem…

No caso dos meus projetos, os quais cultuo e cresço a cada passo, quero ainda andar tanto! Até o dia em que mais de nós sejam livres, escolhedoras das próprias vidas e protagonistas das próprias jornadas, muito além da opinião alheia, da moral e dos formatos para nós desejados, ao ponto desse modus virar história, referência do passado. Vejo na minha filha mais velha estes sinais, e queria estar viva para viver o dia no qual a nossa força representasse uma grande virada no comportamento das gerações que vem aí. Novas famílias, novos formatos, nova maternidade, liberdade, respeito, igualdade, afeto em abundância, talento feminino em exercício… E me dei conta que sou só mais uma que avança devagar, cria filhos e amadurece na tentativa de evolui nesse caminho.

Então, pensamentos esquisitos à parte, quero contar uma esquisitice. A cada traço novo do meu amadurecimento, saio correndo e de forma reativa na busca daquilo que me faz sentir mais jovem, que me faz voltar um pouco… Que me dê a sensação de que ainda posso, ainda “cozinho na primeira fervura”, ainda me apresento apta como antes. E o interessante é que tenho consciência disso.

A coisa vai desde a escolha de uma roupa jovial que já não me representa (momentos que me fazem rir da minha própria atrapalhação), a começar a correr maratona para sentir que sigo forte para os esportes, sempre minhas paixões, ou avaliar procedimentos estéticos que prometem alta performance, morrendo de medo de vir a parecer uma boneca emborrachada. Mas foi a possibilidade de engravidar de novo como prova real das minhas capacidades é que foi realmente esquisito. Caiu da cadeira? Ora, você nunca ligou a sua jovialidade à capacidade de gerar filhos? Jura?

Eu já. Ter a Antonella no meu recomeço, com quase quarenta anos, foi algo que me rejuvenesceu, não vou negar… E em conversas com amigas em pré menopausa e na tomada de consciência de que ao gerar um filho na maturidade isso envolveria ampliar anos de brinquedos na sala, de trânsito na escola, de ser colo para eles, alimento e amparo primário, confesso que foi sedutor e envaidecedor. Pensar neste poder que “ainda” não perdi, foi.

Estou trazendo essas questões, representadas no meu sentir, por perceber que elas permeiam a gente, a muitas. Por entender que no jogo da vida as fases vão ficando mais exigentes mesmo que a nossa mochila de ferramentas esteja a cada dia mais completa e capaz de nos amparar. É exigente enfrentar o fato de que, ao amadurecermos, nos conhecermos mais e desenvolvermos melhor lido com as situações da vida, também vamos perdendo viço e tendo afuniladas as nossas possibilidades nos recomeços. Os prazeres passam a ser profundos, muito mais profundos, mas também mais sutis, com menos pódios. Em uma cultura que alimenta a nossa competitividade inclusive em relação a nós mesmas, como que exigindo que a cada passo à frente tenhamos um coelho saído da cartola, algo bem sucedido, “nascido”, gerado da gente e maior, é apavorante que cada passo adiante nos leve a um caminho mais íntimo, solitário e de poucos aplausos e frutos.

Enfim, uma oportunidade de redesenharmos o que é realização e felicidade para nós na “segunda metade” do caminho. Uma travessia linda a qual venho experimentando a cada piscar de olhos, tateando e percebendo seus sabores. A cada ruga nova, a cada sensação de prazer que sinto no calmo, no conectado e com poucos… Em cada sapato mais confortável do que estonteante. A cada percepção de resultado do trabalho com o meu corpo que aparece mais na alma do que nele próprio. A cada experiência com o afeto e com a “carne” que convida a mais intimidade e menos performance…

Esquisitices à parte, pisar neste terreno pensando “sobre” tem sido garantir prazer reconhecendo que para cada perda tem um ganho. Que as propostas que vem vindo à frente respeitam mais o meu novo ritmo, este que começo a perceber. Que não me envelhece, mas que me transforma. Me dá profundidade… gozo onde não havia, menos pressa e mais contemplação.

Além do mais, se não fosse assim, seria muito injusto para a geração que vem aí, não acha? Afinal, não fosse o tempo, o poder da gravidade e a nossa natural preferência pelo “menos que é mais”, não teria para ninguém além das “maduras”… É o que eu acho:)

Comentários

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *



NEW FAMILIES