Encontrei no último final de semana uma amiga do projeto New Families que tive o prazer de me conectar e me afeiçoar através desse canal que já tem mais de quatro anos. Nos encontramos em um post, nos comentários, e dali, marcamos um almoço nas nossas andanças pelo interior, por Santa Maria e arredores, destino do final de semana que já apontava à frente.

Em um lugar agradabilíssimo, localizado em uma daquelas cidades “faroestes” de colonização italiana, pequeníssima, nos sentamos eu, o meu esposo e ela, mais um bom vinho e omeletes feitos na hora. Aqui saliento que fizemos o pedido de forma sutil, ou o italiano, proprietário do restaurante, se sentiria ofendido com tal escolha.

Discretos, amantes da comida leve, nos entregamos ao vinho e às pautas que permeiam os recomeços, nosso assunto predileto, confesso. Minha amiga digital me contou a história dela, me atualizou dos últimos acontecimentos, e nós, eu e o meu esposo, dos tantos que atravessamos nos últimos tempos e que nos movimentaram.

Não escrevo histórias por acaso. As vivo de forma tão intensa e com tanta predisposição a navegar nas suas águas, mesmo que me exijam aquilo que eu muitas vezes não tenho “ainda”, que contá-las é o que eu chamaria de “ato contínuo”. Como que, comida a fruta, chupar até o caroço fosse algo óbvio.

Tenho vivido momentos exigentes nos últimos anos de forma geral. Nem mais, nem menos dos que vivem as tantas pessoas que acompanho de perto ou sobre as quais ouço falar, mas que vem me exigindo novos lidos, movimentos pensados, mas rápidos, mais conhecimento, menos velocidade, mais tolerância, mais autoconhecimento, enfrentamentos e posicionamentos fortes, vigilância, e menos ansiedade, o que é um desafio particular.

Quando penso que as coisas vão acalmar, vem a vida com um novo “lance”, e isso não é uma reclamação… Está tudo certo que cada etapa desafie mais, ou a vida não me movimentaria. Mas confesso que quando conto e observo a reação estupefata de quem me ouve, me dou conta do quanto ando vivendo revoluções.

Então, minha amiga me perguntou se eu sinto que tive sorte. Se o que se deu na minha vida, que mesmo movimentada me apresentou um tanto de oportunidades de ser feliz, foi um fato particular, isolado e fruto de uma sorte danada, de uma “loteria”, ou algo passível de se buscar. Afinal, tive três filhos, todos lindos, na opinião da mãe coruja aqui, e com saúde, que vivem comigo. Encontrei um amor intenso, que vivo renovando a cada dia, o que me faz ter a sensação de que ele só cresce no tempo. Me viro aqui e ali, e vou me aproximando da minha força vital, do que realizo com prazer, do que vem se desenhando a minha vida própria, com a minha cara, o que sei, pela minha consciência e pela percepção real da amiga à minha frente, o quanto é feliz.

Então refleti… Sempre disse que não há nenhuma sorte na minha história, já que no meu trajeto tem sempre tantos trancos e barrancos, que eu teria motivos para acreditar que me faltou um tanto dela. Que se ela fosse minha companheira, eu teria vivido menos desconstruções, batalhas, em uma vida que me exigisse menos resiliência e uma superfície menos cicatrizada ou tatuada com as minhas viradas necessárias. Era independência ou morte, afinal… Então eu nunca me senti iluminada por essa luz da sorte, exatamente.

Só que nas vésperas do meu casamento com o meu marido, esse que caminha comigo, escrevi os meus votos e comecei com a “sorte” como a responsável pela minha então felicidade. Sorte que não reconheci antes pelo meu olhar raso sobre a sua farda usual ou popular. Aquela que se espera sentada.

A sorte da qual me apropriei no meu discurso foi aquela que vivia na minha presença de espírito quando a vida me desafiou. Quando, por algum tipo de fé, de crença ou de energia otimista e desacomodada, acolhi a dor e busquei ideias do bem que me mostrassem outras alternativas. Nunca de graça, sempre fruto de muito trabalho e de um investimento inseguro e sem garantias, mas possibilidades “desbraváveis” e conectadas com a vida que eu desejava para mim e para a minha família, no formato que fosse. Então citei a sorte, ou eu não teria topado as propostas que a minha jornada me fez…  

Só que a pergunta da minha amiga era curiosa e de certa forma buscava esperança. Mais do que identificar a minha provável sorte, ela desejava entender se ela poderia ser de outras também. Se qualquer pessoa que trilhasse o seu caminho como eu trilhei o meu, colheria os mesmos frutos, e aqui eu complementaria, com as mesmas dores e levantares, que fazem parte, vale lembrar, já que nunca disse que as coisas aqui foram conto de fadas, e quem me acompanha sabe disso.

Então, como em retrospectiva, lembrei das histórias de diversas mulheres que acompanhei nos últimos anos, tão incríveis e tão diversas da minha.

A felicidade tem características diferentes para cada pessoa. Sou tão feliz quando vejo um prato de omelete e quase posso sentir a cara feia da minha filha mais velha para a minha falta de criatividade e sofisticação no paladar. Então, não nos estimulamos ao prazer pelos mesmos caminhos, gostos e acontecimentos.

Já vi pavor em mulheres sendo pedidas em casamento por seus amores, pois a circunstância colocava em risco uma percepção de felicidade real para elas. Já vi outras amarem a ideia de romances do tipo “cada um na sua casa”. Algumas não querem filhos e se seduzem loucamente por propostas livres e aventureiras, outras enjoam verdadeiramente com vestidos de noiva e filmes de casamento ao ponto de perderem a graça. Posso lembrar “duas mãos inteiras de mulheres” que não tem mais disposição e saco para investirem em uma nova família e todo o seu pacote de provas, instabilidades e negociações. Novos sogros, sobrinhos, amigos, todos com uma história com a “alma penada” que esteve ali antes delas, ou mesmo, que desafiam ao “tudo de novo”. Que incluem novos começos, filhos, casas, manias, armários, junção de escovas de dente e o céu é o limite aqui…

Está rindo? Pois é a pura verdade.

Viver novos momentos de vida, novas configurações, novo amor e novas famílias é um convite a uma travessia trabalhada demais e que envolve um tanto de escolhas que amparam a muitos e não só a nós mesmas, o que é um desafio para quem recomeça com seus machucados, na torcida por não ferir-se mais.

E quer saber? A vida segue ferindo aqui e ali. Apanhar dela e levantar uma vez não nos garante que as próximas etapas serão de águas tranquilas… A ausência de movimento, a fim de não se machucar mais, também machuca. Então não há ferrolhos, minha amiga… E que sorte acreditar nisso e no fato de que é a nossa forma de lidar com as nossas possibilidades que gera novas perspectivas.

Um dia, em uma palestra, uma blogueira reconhecida disse que quando a sorte chegava na vida dela, a encontrava trabalhando. Pois ela leu meus pensamentos…

O que é valor para a gente constituirá sempre a nossa “guarda” e irá reger as nossas histórias. Sorte a sua se as oportunidades lhe encontrarem trabalhando nas suas próprias construções e atenta ao que realmente desejas para si. Isso seria uma sorte, mesmo…

À amiga querida, companhia mais que agradável deste almoço que gerou toda essa reflexão, desejo fé na sua própria navegação e nas suas possibilidades… Eu, de fora, já posso ver o quanto ela tem sorte ♥.

Às amigas daqui, sugiro que trabalhem em si. É assim que a tal da sorte deve encontrá-las quando chegar, se é que me entendem.

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