Não sou “expert”, aliás, suspeito até não ser muito boa nisso. Nas relações já me pediram calma e “menos” para o meu excesso de zelo. O contrário também é verdadeiro, quando algo no meu coração me encoraja a dar autonomia, me passa tranquilidade para assistir de longe ou de perto a liberdade de quem eu amo, o que para muitos soa como negligência.

Passo avaliando a minha medida, tentando ignorar as forças à minha volta, as mulheres, esposas e mães mais ou menos intensas que eu neste quesito. Respeitando a minha lógica e confiando nos ingredientes e na forma que escolhi para a minha conduta feminina, nas relações e na maternidade. Observando eles, suas desenvolturas frente às situações da vida, suas oportunidades, seus desafios, suas provas. Todos tão diferentes…

Já aconteceu no meu casamento de um “servir” e cuidar demais. Fui percebendo nos movimentos do meu marido e no nosso casamento o quanto eu ocupava o espaço dele quando fazia isso. A coisa toda permeava a nossa relação conjugal e a parental também. No ímpeto de poupá-lo, de tornar o ambiente harmônico, pela minha capacidade de abraçar mais e mais coisas, e de zelar pela rotina da nossa filha, muitas vezes reduzi a pouco o espaço dele de pai. Assumindo tarefas e antecipando o jantar, mitigava questionamentos, alternativas diferentes, liberdade, aprendizados. Em outras cearas da relação, a corda era mais solta. E nestes casos era tanta, que gerava eventual insegurança e aparente ausência de atenção. Quando achava que estava agradando, confiando e vivendo uma relação sadia, na verdade estava gerando no meu parceiro atrapalhação e carência de cuidado.

Das pombas que a gente tenta desenhar, e quando vê, fez um urubu. Não foi a minha primeira vez, nem será a última… Nem no uso do termo, nem no design do bicho.

Com os meus filhos não é diferente, sabe? Minha filha Joana tinha três anos de idade e levava copos de vidro até a pia da cozinha, a meu pedido. Lembro-me das pessoas me massacrarem por dá-la tal autonomia, pelos riscos de cair e se machucar, assim como quando tomava banho sozinha, sob minha supervisão, ou subia e descia as escadarias dos três andares da nossa casa com liberdade. Também quando caía, nunca fui de fazer cena nem me exceder em preocupações. Não foram poucas as nossas idas ao hospital aqui em casa, tanto com a Joana, quanto com o Joaquim e agora, com a Antonella. Sempre consegui separar a queda, o abatimento, os sintomas de qualquer bactéria, vírus ou inflamação, do risco real para a vida deles. Em cem por cento dos casos eles precisavam de calma, da minha tranquilidade. Então o que para muitos poderia parecer descaso meu, argumento que se tratava de autocontrole e consciência da minha função. Nunca assumimos riscos graves e por algum motivo eu sabia disso. Como mãe, talvez… Com aquilo que me faz mãe.

Essa semana, após quase dois anos de pandemia e aulas on-line, minha filha mais velha fez a primeira prova presencial, e no papel, não mais digital. Ela cursa o sétimo ano e transita no caminho ainda muito tênue entre a infância e a adolescência. Percebo que às vezes ela precisa de mim como uma criança precisa da mãe, e em outras, a minha mão é inoportuna e desajeitada. Pois apenas dei “boa sorte” no atravessamento daquilo que entendo ser da vida e do recomeço que todos nós estamos enfrentando. Ela foi e desempenhou bem o desafio, principalmente emocional. As notas dela estão boas, então ela foi sem estresse. As mensagens do grupo de pais apitavam enlouquecidamente quanto ao choro e nervosismo da maioria, do quanto as “crianças” se vulnerabilizaram frente ao retorno à “arena da vida”, digamos assim.

Sem computadores, portas fechadas, cadernos de consulta organizados ou a ajuda do Google, eles precisaram dar conta. E posso imaginar o quanto pode ter sido desafiador. Ocorre que, mesmo assim, não me senti no direito de protegê-la. De querer diferente para ela, menos exigente ou mais acolhedor. Senti que a vida pede que eles se desbravem nessas enrascadas e que o meu cuidado deveria me colocar apenas atenta. Não leoa. Mas sutil, “gata” quem sabe. E pelo clima do grupo, me parece que talvez eu seja uma das poucas a pensar assim.

O fato é que este é um telhado de vidro para mim, não vou negar. Talvez para todas nós. Como saber se estamos cuidando suficientemente de quem amamos ou estamos exacerbando o nosso direito nas relações e cerceando o desenvolvimento e a liberdade do outro? O que é frustração necessária ao crescimento, do que for, ou abandono, motivo de insegurança e carência? Na base das nossas relações devemos ser viga ou ser água? Sustentar, assegurar, ou fluir e permitir que fluam? E qual é a medida?

Não acredito em “receitas” para isso, mas se você souber algo que possa inspirar a minha dose de cuidado, manda para mim! Se tiver lógica, quem sabe não me ajude a sentir mais segurança quanto ao que estou me propondo a ser e não vire fé? Sou toda, ouvidos…

Enquanto isso, sigo em experimento no laboratório da vida. Ouvindo o meu coração. Acho que a medida do cuidado tem tudo a ver com o que se passa nele. Pelo menos é o que eu acho… E além disso, a referência é minha:)

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