Ouvi que sou uma mãe que faz o básico bem feito. Fiquei congelada na hora, tentando absorver de coração aberto a percepção do interlocutor sobre mim, alguém que me conhece, e entender o que significa fazer o “básico bem feito” sem que isso pareça pouco, restrito ao “básico”, ou ainda, dar conta do fato de que eventualmente faço menos do que eu deveria na minha missão de mãe.

A minha primeira reação não foi de defesa, juro para você. Foi de culpa. Mãe que é mãe puxa a culpa para si, não é assim que a gente faz? A gente entrega tudo o que pode e mesmo assim se sente responsável por qualquer coisa que não sai como planejado, idealizado. A mãe que quem somos permite que sejamos, com toda a nossa natureza, referências, desejos e construções edificadas no decorrer da vida, no amor e na dor, é também quem “sofre esse pênalti” com o coração na mão, fora do corpo e escorregadio, pela sensação de ter falhado… Oferece o que acha que deve e assim mesmo está sempre devendo, sabe o que eu quero dizer?

Pois degustei aquela impressão em toda a sua essência, pensando o quanto tive que balancear, distribuir pesos e equilibrar as minhas necessidades de forma que a minha sanidade mental fosse resguardada, e quem eu era e sou tivesse algum espaço, ar, mesmo que não intencionalmente. Mesmo que o meu limite falasse, e não eu. Quando ele me protegia da minha própria incapacidade de ser mais ou de ir além, me fazendo assim a mãe suficientemente boa, e não, excepcional.

Muitas vezes, ao me dedicar demais a uma coisa ou outra, errei na dose. Perdi algumas vezes como mulher, como esposa, outras como amiga, como profissional, e algumas como mãe. Tive momentos que por “esgaçar” as minhas capacidades ou investimentos, precisei de ajuda. Tentando ser mais do que eu poderia ser aqui e ali, tentando talvez dar conta de tudo, de ser incansável e infalível, ou ter o reconhecimento do meu entorno, dos meus filhos, me desfigurei, me perdi, adoeci.

Meu primeiro casamento sofreu dessa falta de medida, sabe? Sucumbiu, em parte, à minha busca por excelência em um tanto de missões que entendi mais importantes do que eu e do que a minha relação conjugal, entre outras coisas que já a enfraqueciam, é claro. Meus projetos, algumas carreiras que me traziam prestígio e dinheiro, perderam força aos poucos, conforme eu ia escolhendo me dedicar com tudo o que eu tinha em uma parte ou outra de mim que demandava de mais. Posso lembrar como se fosse ontem da noite em que recebi alguns amigos para jantar em casa e a minha melhor amiga me chamou em um canto, a fim de saber onde andava a minha alma. O que havia me abatido ao ponto de tirar a luz dos meus olhos. E eu era mãe. Uma mãe presente e feliz por ter os meus filhos comigo, atendidos excepcionalmente bem, lindos e sadios. Só que eu era uma mãe excelente, e talvez só isso e nada mais. Talvez uma executiva exausta e mediana que vivia a ausência de vida, de amor, da realização de sonhos ou mesmo de cursar a própria história.

Então, ao ouvir aquele que falava sobre mim e a minha maternidade, fiquei com o tal “básico bem feito” acomodadinho no meu coração, sob os holofotes da minha própria reflexão. Será o básico o meu tamanho ideal? Será o básico o meu limite mais alto, o meu “possível”? É tudo que os meus filhos terão de mim? Esse “básico” que eu apresento a eles no meu dia a dia?

Me lembrei do fato de que eu abandonei a capa de super-heroína depois das minhas crises de ansiedade e de me dar conta que tenho pessoas importantes para mim que não se resumem à excelência da minha maternidade. Estou falando da Joana, do Joaquim e da Antonella, seres humanos como eu. Estou falando do meu marido, em quem invisto e entrego o meu afeto, tempo e investimento. Da minha escrita, do meu trabalho, do meu exercício físico diário, das minhas amigas, de mim mesma, da atenção que dou às minhas dores e sentimentos, tudo tão valioso e que carrego na minha mais alta estima.

Então, eu não poderia me resumir talvez em uma mãe excepcional. Sei que isso mataria outras de mim. E aí o “básico bem feito” me pareceu bom o suficiente. Por me propiciar ter o “básico bem feito” comigo mesma, no meu casamento e na vida, de forma que eu possa ser um pouco de tudo isso que faz parte de quem eu sou, sem abandonar a minha alma. É mais do que o meu possível, é o que eu desejo. Além de dar conta de viver com o fato de eu ser uma mãe que faz o “básico bem feito”.

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