Se eu fosse certificar a “amiga de infância” pela sua relevância na história da gente, pela minha ótica, talvez eu diria que ela se dá por ser essa figura uma testemunha de quem fomos e daquela nossa passagem da vida. Ninguém contou para ela o que se deu conosco quando éramos crianças. Ela viu e sentiu o que fomos. Teve a sua própria perspectiva dos fatos, se conectou a quem éramos. Nos acompanhou na vivência, foi parte da cena, compartilhou daquela época, da realidade da qual vivíamos e seus costumes. Acompanhou perdas e ganhos do crescer, ofereceu o que tinha em troca, pesos e presentes. Nos fez sentir importantes com isso, acompanhadas. Por algum motivo que só o mundo das afinidades poderia explicar, escolheu andar junto, se permitiu misturar-se quando ainda descobríamos sobre nós mesmas. E quando ela permanece com a gente no decorrer dos anos, se torna valiosa simplesmente por, depois de tudo, bom ou ruim, ter ficado. Escolher por entender sobre quem nos transformamos, aceitar e desejar manter-se perto. Bonito, né? Eu acho lindo…
Tenho o privilégio de conviver com amigas de infância. Uma “prima irmã” e duas irmãs que mantive próximas por escolha e com as quais tenho uma relação especial de amizade desde que me entendo por gente. Mais de uma amiga da escola, de pequena, com as quais ainda mantenho contato sempre que posso, trocando lembranças e mensagens de saudade. Uma em especial caminha comigo até hoje, e mais do que isso, atravessa tempestades segurando na minha mão, independentemente se ela vem do sul ou do norte, do leste ou do oeste, de cima ou de baixo, e até daquelas que acontecem do lado de dentro. Uma raridade, posso afirmar. Não viveria sem… não teria graça.
Mas tenho as que eu chamaria hoje, parafraseando uma pessoa querida que reapareceu na minha vida, de “amigas novas de infância”.
Amei o termo, apesar dele ter mais sentido pelo carinho atribuído às amigas que chegam do que pela sua real qualificação, já que elas não estiveram lá na infância com a gente. Não conhecem a nossa história pelo que viram, mas pelo que compreendemos dela e compartilhamos. Se conectaram por um sentimento gigante que nasce com o ser grande que demonstra interesse em crescer na gente conforme amadurecemos, e que em muitas de nós pede aprofundamento, conversa longa, degustação, parada, questionamento, mudança. Se interessam por aquilo que escolhemos ser e se identificam com o nosso caminho, seja por semelhança, seja por empatia.
A maturidade é um terreno cheio de presentes como este. Nos mostra que podemos ir e voltar, na consciência do que foi valioso para nós, naquilo que desejamos transformar, entender, perdoar, refazer, recomeçar. E essas amigas que chegam oferecem um universo de possibilidades livres de quem fomos, de quem nunca conheceram e que, por isso, não exigem que carreguemos, caso não seja mais a nossa vontade. Nos libertam do que acreditamos eventualmente que nos definia, nos convidando a novos horizontes e caminhos que do lugar de sempre não conseguíamos enxergar.
Outro dia misturei uma amiga de infância que ficou e uma nova que chegou. Uma trança linda de conversa e carinho foi sendo desenhada no meu interior por aquela que conhece meus olhos desde os tempos de escola e baixíssima autoestima, e por aquela que me instiga hoje a voos novos por tudo aquilo que enxerga em mim, na pessoa que recém encontrou. Antiga e nova pintam o sete no meu processo incansável de descoberta. Ornamentando a minha “nova casa”, em permanente mudança, com uma mistura do velho e do contemporâneo que não me deixa esquecer quem eu sou e que posso ir para onde quiser e me permitir com o que tenho na minha bagagem.
Noite dessas encontrei dois novos presentes da minha vida adulta para um programa de sábado à noite. Duas mulheres divorciadas. Duas amantes de vinhos e drinks, de papos profundos, de viagens, de recomeços. Duas mães que trabalham, que atravessam questões familiares exigentes, desafios na orientação dos filhos, no autocuidado, no autoconhecimento, na auto realização e com novos amores. Insaciáveis na busca pela própria paz, sentido e felicidade. Duas mulheres que eu poderia ter conhecido na infância, mas não conheci. Que foram guardadas com carinho pela vida para o momento certo, em que eu sentaria em uma mesa de bar e me permitiria me aprofundar e avançar sem medo, encorajada por inconformadas e cheias de vida, de desejos e sonhos, como eu, a provar de mais coisa, enfrentar o novo e revisitar o velho normalizando e compartilhando temores e dores, com a liberdade de quem recomeça sempre que quer.
Como Elton John e Dua Lipa, o que pode ser melhor que o encontro do velho e do novo, de tudo o que fomos com tudo o que somos em um grande, justo e tocante “popurri”? Um viva às amigas de infância, novas e velhas, que se afeiçoam a quem somos e ficam, onde quer que isso tenha começado. Vocês embalam a minha vida com colo, música, drinks, sabores e um amor inimaginável. O que mais eu poderia querer?
Ok… Vocês sabem:)
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