Não dá em árvore…

Estava aqui pensando sobre a autoconfiança como base da relação da gente para com a gente mesma durante a vida. No quanto achei que a falta dela podia ser algo não construído na infância, não oferecido na nossa formação afetiva e enquanto indivíduos, e por isso, algo definitivamente perdido ou “não achado” por muitas de nós. Enfim, mais uma culpa dos nossos pais… Por omissão, por falta de consciência da sua corresponsabilidade nisso, ou pela crença de que a nascente dela se dá em outras fontes.

Talvez por isso me dê conta de que, por tanto tempo, vivi, enquanto mãe, buscando formas de construir cenários nos quais meus filhos pudessem se sentir seguros, estimulados e valorizados ao ponto de confiarem nas suas potências e em si mesmos a partir da minha condução parental e afetiva abundante e atenta. Porque assim, seria uma forma de prepará-los para o tanto de desafios que a vida nos apresenta e que em tanto demandam de confiança em nós mesmos. Naqueles trajetos que são nossos, particulares, não “terceirizáveis”. Que pedem que a fé seja dirigida à gente, a fim de termos, pelo menos, já que garantias não há, a fortaleza de enfrentarmos nossas lutas acreditando ser possível darmos conta e até vencermos, quem sabe…

Juro que venho pensando muito nisso e no significado dessa construção e seus eventuais responsáveis ou “operários” para que ela efetivamente se dê.

A confiança é tecida a partir do cumprimento. A gente confia naqueles que se comprometem conosco de alguma forma na vida, seja na cena que for, e cumprem. Os termos são livres e são muitos. Os contratos abrem janelas, concedem, negociam, mas constituem acordos que são pactuados entre pessoas e passam a estabelecer contornos seguros, bases conhecidas para nos estabelecermos por um tempo, em um uso, abuso, ou a vida toda.

É assim na maternidade. É também nos ambientes profissionais, e não diferente nas relações afetivas, sejam elas de amizade ou de amor romântico. E foi aí que percebi que a minha autoconfiança, e a tua, não seriam de responsabilidade de ninguém fora de quem “senta na mesa” deste acordo. Que ele envolve, de forma pragmática, uma negociação da gente com a gente mesma, exigindo neste trato, comprometimento. Cumprimento do que foi proposto, ou melhor, do que nos propomos para com a gente. Ou a gente não confia…

Percebe que a dinâmica é a mesma? E que costumamos levar mais a sério aquilo que acordamos com os outros do que o que nos comprometemos com nós mesmas?

Nos comprometemos em sermos boas mães e não faltam visitas ao pediatra, vacinas, concessões de tempo, de espaço e de afeto, ou planos que os envolvem, sem contar quem tolera muitas vezes uma relação de casamento, de trabalho ou de vida apática ou adoecida, apenas pela ideia aparente de atendê-los. A gente atrasa, reconfigura e ressignifica, aqui e ali, mas cumpre o que nos determinamos. Quando a gente os observa, bem ou mal, percebe o investimento e o motivo da confiança naquela relação, assim como os dissabores que geram os descumprimentos com eles, como a culpa e a desconexão.

Contratamos entregas no trabalho e corremos feito loucas para atendermos prazos, horários e metas. Atrasamos aqui e ali, mas não faltamos, ou damos conta do amargor da retaliação na carreira, no bolso, na perda de oportunidades, ou ainda, no reforço daquela inverdade que nos tira a força do feminino nos ambientes profissionais.

No casamento, estabelecemos alicerces e pontos de boa convivência e encontro de expectativas a fim de cada um fazer a sua parte na construção de uma relação confiável. Quando alguém falha nesse trajeto, o que naturalmente acontece, aqui e ali, a colheita é obrigatória. Adoecemos com a relação, quando não a matamos pela ausência de cumprimento do que atende a ambos ou pela simples falta de confiança, aquela que nos coloca para dormir à noite tranquilos, por estarmos em ambiente amigo, amoroso, e não hostil e ameaçador. O divórcio, peculiar ao descumprimento deste contrato afetivo, se dá pela falta da confiança, do abalo dela, nas cearas mais profundas, muito além de um fato ou outro… Na falta de investimento, no olhar, naquilo que não foi dito, que já foi e deixou de ser, naquilo que é gritado e que não estava amparado pelo “acordo” base da relação de confiança, naquilo que transformamos em nós e não compartilhamos com o outro, deixando-o para trás. Então, por vezes ela se quebra e desmancha com tudo.

Na relação com nós mesmas é exatamente a mesma coisa. Como confiar naquela que não faz a revisão de si mesma no médico e depois é surpreendida por algo que a ofende a saúde por negligência? Como confiar naquela que se tira das cenas, se desconsidera, se deixa para depois ou nunca mais? Como confiar naquela que começa com algo bom para si mesma e se boicota, desiste e tira de si a confiança na sua própria potência de fazer acontecer, de se atender, de cumprir consigo, bem mais valioso que temos aqui? Como confiar naquela que não acredita na própria fala, no próprio sentir e nas próprias vestes?

Pois foi disso que me dei conta. A minha autoconfiança não poderia ser construída por mais ninguém que não por mim mesma no trato sério com as minhas necessidades, com a minha essência natural, com a minha aparência, com o que me realiza e com a seriedade no lido de tudo o que me compromete comigo mesma.

Outro dia levei um baque. Uma situação financeira e profissional. Em ato contínuo minha saúde me golpeou também. Tudo junto. E eu me vulnerabilizei… Por alguns dias me bateu aquele natural desespero de quem não sabe se consegue virar o jogo, fazer de novo, recomeçar, atravessar. Pois talvez me faltasse força, já que fui abatida por mais de um golpe.

Foi quando uma amiga querida tomou comigo um café e me lembrou do tanto de vezes que eu recomecei. Do quanto conheço esse caminho do levantar. Do quanto já dei conta mais vezes do que os meus dedos poderiam contar. Do quanto já foi desafiador atravessar túneis quando na minha mochila eu tinha muito menos do que tenho hoje. Corri para os meus textos mais agudos. E por eles fui lembrada do que embasa a minha autoconfiança, o que a sustenta. O fato de eu já ter cumprido comigo e com os que eu amo tantas vezes. O fato de que eu posso realmente confiar em mim pelo que eu já fiz, já provei a mim mesma, já construí de sólido e seguro no meu interior de forma que transbordou para fora, dissolvendo inseguranças e criando alternativas aqui e ali. Pois posso confiar em mim, já que, mesmo tendo me “abandonado” algumas vezes, no exercício de alguns dos meus papéis e da minha própria existência, jamais deixei de voltar e me resgatar, por consciência ou por necessidade.

Então, não é culpa de ninguém, querida. A presença de autoconfiança é um contrato sério e é você com você. Ou você cumpre e conquista a sua, ou você simplesmente não a terá. E essa é uma prerrogativa de todas as relações que desejamos genuinamente que deem certo na vida, que sejam ricas e sólidas.

A que se dá com você é para a vida toda… E então, está cumprindo com quem mais importa?

Desejo de verdade que sim. Se não, senta agora e recontrata… A mesa está posta e você urge por isso ♥

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