Li dia desses na revista Vida Simples que a nossa verdade, a nossa autenticidade, cresce conforme atravessamos a nossa jornada pela vida. Que ela vai se encorpando a medida que caminhamos. Que não nos “achamos” em um momento pontual, em uma “passagem”, uma vivência, ou de uma hora para outra. Se dá do início ao fim. Um aprendizado interno que não se acaba até que o nosso tempo aqui termine. E confesso que senti um alívio por me ver ainda “me atrapalhando” comigo mesma aqui e ali, sem que isso pareça um “retardo” meu ou qualquer tipo de resistência minha à aprendizagem…

A gente acha que se conhece, né? Basta que passemos por meia dúzia de situações na vida, que nos sentimos “safas”, potentes o suficiente para darmos conta do que for e capazes de identificar qualquer situação nova de perigo, de angústia, de esgotamento ou de despreparo. Pensamos saber tudo de si mesmas e que já dominamos os nossos caminhos internos e saídas para cada exigência que nos espera. E a minha surpreendente tranquilidade nos trechos da leitura sobre a extensão dessa jornada interna se deu por identificar na minha vida meus pontos ainda de sombra, meus cantos ainda escuros e incompreendidos por mim mesma como algo natural do meu próprio caminho longo. Me tirando o peso do acerto, da desenvoltura para levantar daquilo que é buraco novo na minha estrada.

Só que eu trouxe o assunto também motivada pelas histórias que acompanho e pelos medos enfrentados pelas mulheres que assisto recomeçar, além de mim.

Quando identificamos algo que não nos cabe ou que não é mais conectado às nossas vidas, isso não nos protege de novos obstáculos, desconhecidos, ou até parecidos com aqueles que já vivemos, equívocos e “atrapalhações”. A gente se desconfigura em situações distintas e momentos de vida de novas exigências… Vivemos em metamorfose constante e me parece natural que às vezes nos olhemos no espelho em meio a correria e, de repente, não saibamos como fomos parar ali, daquele jeito e tão sem saber por onde começar os ajustes. É mais do que dizer que não temos garantias. É entender que podemos nos perder de novo de diferentes formas sem que isso seja teimosia, mas sim, algo do caminho do nosso próprio experimento.

Só que o nível de exigência parece aumentar junto com as responsabilidades e nas quedas nos cobramos uma recuperação rápida e efetiva, já que a roda não pode parar…

Quem disse? É na parada que percebemos, que sentimos o que está nos acontecendo. É diminuindo a velocidade que priorizamos a escuta a nós mesmas. É ali, no ponto zero, que estabelecemos novas rotas e nova dinâmica nas nossas vidas, assim como ajustes no que precisa de transformação. E a correria não nos permite enxergar, digerir. Nem acolher. Ela sublima detalhes importantes sobre os quais muitas vezes passamos por cima. Retalha processos de cura que demandam tempo, que precisam simplesmente “se dar”. E está tudo bem pedir um “tempo” para o nosso mundo, para a nossa rotina, para iniciarmos com os nossos recomeços, tão necessários na vida…

Saí outro dia para trabalhar com uma calça de couro ecológico do ano passado, que de parada no armário, começou a se desmanchar no meu corpo. Não vi isso acontecer, mesmo enquanto eu me arrumava de manhã, pois a minha cabeça não estava ali, me vestindo… Foram duas ocasiões nas quais saí com roupas abertas ou com defeito sem ver. Não foram poucas as vezes que deixei de escutar os meus filhos contando as histórias do dia, dada a minha aceleração. Também aconteceu uma falta de ar, aqui e ali, pelo esgotamento que se deu na minha rotina, e muito, pela minha auto exigência. E isso já havia acontecido antes, o que me fazia acreditar estar livre da velocidade que imponho a mim mesma desde sempre, e seus efeitos nocivos. Só que em um momento diferente, ela voltou diferente também, e me pegou. Me atrapalhou. Me mostrou o quanto eu precisava ser escutada, amparada e reiniciada por mim mesma.

Então eu parei, sentei na beira do meu buraco, daquele que mais parecia um furacão, e me concedi o privilégio de respirar fundo e parar de andar. Larguei bagagens, revirei-as, tirei os sapatos. E como o respeito que dedico ao meu corpo quando executo exercícios físicos exigentes deitada no “colchonete” da minha aula de localizada, e obedeço às ordens da minha “profe” quanto a sentar e levantar devagar, dediquei a regra à minha alma.

Primeiro sentei, e então levantei devagar… Pois minha alma, assim como o meu corpo, tem seu tempo… Precisa dele e desses momentos para florescer, para ampliar a sua autenticidade, para me levar a um passo à frente, mesmo que me exija “atrasar” um pouquinho as coisas nas quais coloquei a urgência da vida moderna. A vida não é uma competição, afinal. É uma maratona, né? Queremos atravessar, não é isso? Com a sensação, lá no final, de que fizemos a nossa própria jornada?

Pois a vida não é uma vitrine de exposição de ganhos e da perfeição. Nós já sabemos que ela não existe, que não somos tão importantes para os outros, que a nossa cura está na evolução da nossa aprendizagem e autenticidade, e que os desafios os quais viveremos só terminam no fim. Então, sem pressa… Senta na beira dos buracos da vida e os observa, assim como a você mesma. Se há uma chance de se sair mais em paz das disrrupções que a jornada oferece, o que já a torna uma travessia de sucesso, é movimentando-se lentamente e sentindo tudo o que é para ser sentido. Diluindo e compreendendo tudo o que precisa ser atravessado, transformado e evoluído. A fim de evitar engasgos ou falta de ar…

É só sentar, e então levantar devagar, ok? Sem pressa. O mundo não vai acabar:)

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