A gente não precisa acertar quando fala, nem saber exatamente o que quer dizer. A comunicação de quem a gente é e do que desejamos é algo que não é certo ou errado. Nem tem regra de etiqueta, nem precisa ser adequado. A fala quando autêntica diz sobre a gente, nos apresenta, nos posiciona, aprofunda nossa relação com o mundo, constrói conversas interessantes, descobertas, novas perspectivas e conhecimento, mas principalmente, autoconhecimento. Não precisa estar sempre certo, pois além da conversa não se tratar de uma competição entre as partes, se fosse assim, ela traria só medo, desconforto e controle, e não mergulho, troca, envolvimento e aprendizados.

Lembro da provocação na minha vida escolar, por parte das pessoas mais inteligentes que me rodeavam, que me instigava a ser questionadora, a perguntar em sala de aula, a participar de debates, e confesso que o terreno da adolescência me soava um tanto árido para tal audácia. O medo de errar e ser diminuída pelas minhas dúvidas, e quem sabe ser definida por elas, me colocava mais quieta do que exibida. Também, naquela época, a vergonha era um prato mais sortido e abundante do que é hoje, quando virou moda enfrentá-la e superá-la, ao ponto de virar tema de livros e palestras de uma das mulheres mais admiradas dos nossos tempos. Lá atrás “boca fechada não entrava mosca” e era educado até falar pouco ou quase nada, e se manter distante das conversas dos adultos… O que vinha deles não era estimulante, pois crianças não deveriam importunar e a “fala” delas era inoportuna. Conheço um monte de mulheres que, como eu, se desencorajaram a se posicionar por muito tempo por conta das desaprovações da infância que tanto constroem os nossos contornos adultos…

Um tanto a ser superado, uma pena e uma oportunidade. Aprendemos nas relações e trocas muito além dos temas debatidos. Aprendemos principalmente sobre nós mesmas em ação. Não sobre o que se passa da pele para dentro, mas como tudo que está ali interage com o mundo lá fora, ganha vida, nos dá vida. Enquanto vive só dentro não existe, então é fora que identificamos o que ainda dói, intimida, o que falta, sobre o que desejamos saber mais ou aquilo que não nos interessa. Caminhos que nos ampliam e aqueles que nos reduzem. Não é no espaço da mente, mas na cozinha de casa, na sala, na cama, na fila da cafeteria, nos corredores do escritório, do mercado, da escola das crianças ou da vida que a coisa acontece. É quando falamos que identificamos onde estamos, e nesse contexto, desenhamos novas rotas curiosas e desbravadoras.

Tenho assistido a filmes e lido diversos livros e artigos sobre o comportamento de mulheres em ambientes nos quais se dá o abuso psicológico. Dentre eles, o do casamento, como contexto mais comum. E a ausência de fala, de posição, de exposição do desejo, do desconforto, do sofrimento, do medo, das dúvidas ou mesmo do que é conflituoso e tão necessário de ser tratado, é uma constante. Frutos de acordos não claros, de sequestros emocionais, da desconfiguração do que é o amor e do cuidado, de forças culturais de gênero que ainda permeiam as nossas relações e a nossa sociedade. Figurando o desencorajamento da existência da mulher na relação, uma vez que a exposição gera o medo do abandono, de represálias, do fim da família, do plano idealizado e “esperado”, mas principalmente, da falta de si mesma. De autoconfiança, de autoestima e de fé.

Some então a percepção do que se gosta. Do que se acredita. Do que se quer para si. De que forma se deseja viver e o “pelo que” fica embaçado e nebuloso. Se vive uma outra vida que não a sua própria. E aí, se depende “dela”, lá fora, e não de si mesma.

Então, aproveitando a deixa da ficção e da literatura, que só reforça a minha crença de que a arte imita a vida, e não o contrário, fala! Só para garantir que o que está em você, que caminha ao lado do seu parceiro, dos seus filhos e na sua vida está vivo, ativo e em ação. Explorando o seu potencial nutrida e abastecida do próprio combustível, motivações e crenças. Da sua escolha sobre como viver o amor, pois é assim que o entende. Ou a vida, já que é de tal forma que a reconhece e deseja atravessá-la. Ou os sonhos, já que eles são próprios e por isso encantam tanto.

Diferente disso é um abuso, além de um desperdício que, se foi necessário que se desse, depende de uma decisão só sua para ter fim. Se você não sabe por onde começar, fala. É uma boa forma de soltar as suas “borboletas” e viver momentos interessantes. Prometo que não dói nada, é de graça e não soa inoportuno.

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