Abri a minha semana vendo um post de uma amiga que falava da perplexidade que a abateu por sentir o preconceito frente a sua felicidade na “ausência” dos filhos. Ela recomeçou a vida após um divórcio, e como eu, se apaixonou e vive hoje uma parceria afetiva que atende a mulher que ela é e a vida que deseja. Tem seus filhos, fruto do primeiro casamento, mas na ausência deles, quando com o pai, se diverte com o novo amor. Uma pessoa que já divide a intimidade com ela quando com os filhos e que, como todo o casal que se curte, aproveita a casa vazia deles.

Pois senti no relato dela a acidez da lembrança dos tempos nos quais podia quase tocar o preconceito face à minha felicidade. Senti a memória cavoucar o meu estomago, assim como a confusão que se deu em mim tantas vezes por conta dos meus papeis, funções e missões na vida e a culpa de tentar atendê-las além da maternidade. De quando eu começava o romance com o meu marido e em muitos momentos me senti desautorizada e envergonhada por estar feliz após um divórcio, sempre doloroso. Culpada por passear bem “faceira” por aí ou curtir com prazer a nossa casa e um bom vinho quando eles estavam no pai. Ou ainda, por ser pega com a “boca na botija” da felicidade quando, para quem me encontrava, eu deveria estar sofrendo…

Se a gente pensar bem, isso se dá toda a vez que a vida de uma “função nossa” ilumina outra com seus raios de luz. Estar muito feliz e realizada na vida íntima quando se é profissional pode significar que estamos desfocadas, não trabalhando suficiente e valorizando demais a família ao invés da carreira. Como que a “bem sucedida” precisasse não ter filhos ou apresentar uma vida afetiva em frangalhos como prova da sua dedicação à carreira e a produção de receita. Para trabalhar e crescer precisa abandonar os filhos. Assim, para ter filhos e uma relação afetiva rica e feliz, nada de trabalhar duro, ora… Sem falar na realização como mulher. Como ser feliz no amor sem ser taxada de mãe egoísta ou até negligente, desatenta, desligada? Não é assim que tudo parece? Não é assim que as cenas da vida nos fazem sentir em relação aos nossos papéis? Uma coisa ou outra e assim todos eles perdem, vivendo uma vida “mais ou menos”, com todos os ovos em uma cesta só?

Equilibrar parece um ato de desinvestimento nas nossas partes e não de investimento… Como se precisássemos ter apenas uma coisa, entregando o resto do que nos constitui aos urubus.

Na felicidade após o divórcio também é assim. Vi o post da minha querida amiga e ele só era uma repetição do tanto que escuto, que compartilham comigo na intimidade e no projeto de novas famílias que toco. O sofrimento, a dor e as exigências de um divórcio não tem nada a ver com a nossa capacidade de reconstruirmos e sermos felizes. Decidir tratar a dor, interromper o ciclo do sofrimento e abrir-se a felicidade são escolhas diárias e não subestimam a tragédia do que se deu. Apenas diminuem o drama, não o peso das batalhas. São apenas ações que escolhem por continuar melhor. Por ser feliz de novo. Por experimentar novas formas, novos sabores, novas de si mesma. E por algum motivo as pessoas seguem esperando sofrimento e dor de quem promoveu em si a cura após uma disrrupção importante.

Quem é mãe, é mãe o tempo todo, junto dos filhos ou separada deles. Na “nova maternidade” após um divórcio, a atividade materna se compõe apenas de forma diferente, compartilhada. Sobrecarrega os momentos junto, esvazia os separados, mas segue maternidade, segue amor, segue responsabilidade, segue missão. É o formato que muda. Uma realidade exigente no início e que depois acostuma e remedia as suas dores. Um trajeto que exige redesenho e acomodação das “melancias da caçamba afetiva” e daquela que orienta as rotinas do dia a dia.

Aprendemos a nos acolhermos como mulheres mães nos primeiros momentos de solidão sem os filhos, tecendo uma nova forma de viver. Descobrimos no vazio, lugares novos de felicidade. Na gente, caminhos surpreendentes de alegria e de autoconhecimento. Na maternidade, a existir na ausência dos filhos. Encontramos espaço, novas atividades e novas relações. E isso não precisa ser ruim simplesmente porque não estamos com as nossas crianças ou chorando pelo casamento que se foi. Ao contrário, nutre a mulher mãe que segue em frente.

É como aprender a caminhar adulta. Com obstáculos internos e externos suficientes…

Então, para você que me lê, se encontrar alguém sendo feliz trabalhando no que gosta enquanto os filhos estão na escola ou “cursando a vida”, ou ainda uma mãe sendo feliz por aí, passeando, namorando e “vivendo” enquanto os filhos estão com o pai, simplesmente dá um sorriso de autorização, principalmente se você for uma mulher. Se ela estiver precisando desse empurrãozinho para se entregar a um momento feliz, afinal, vivemos cheias de culpas, vai ser uma benção ter o seu consentimento, acolhimento e impulso. Mas se não tiver disposta a dar esse sorriso e tornar o momento algo bacana e incentivador para aquela que após a sua luta está buscando seu lugar ao sol de novo, e construindo a sua felicidade no depois, dando conta do fato de que os filhos não estarão mais com ela “sempre”, então nem olha…

Quem não ajuda, não atrapalha. E todas nós merecemos o feliz. Não?

Não espera estar nesse lugar para entender isso.

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