Pessoalmente, filme ou livro bom é aquele que me emociona. Preciso ser tocada pela história em algum lugar fundo, que me convide a entender os valores do personagem, a sua dor e o seu amor, para gostar de verdade da obra. Não precisa me dizer nada de mim, mesmo que seja bom que diga, mas precisa dizer algo da vida que me provoque a ter outra perspectiva sobre o assunto que for. Uma nova, que no final das contas, acaba dizendo sobre mim, sim.

Interessante… É assim que a emoção nasce na gente, eu acredito. Assim que nos conectamos ao mundo e esculpimos o nosso caminho particular, o nosso lido com a vida e com os afetos: com o que nos afeta de alguma forma.

Dito isso, quer chorar de lavar a alma? Daquele choro bom de comoção pela força que o amor tem na vida e que te faz reforçar a fé nele e no poder que tem sobre as pessoas e sobre o roteiro de suas histórias? Sem idealizações?

Então, vou te indicar uma minissérie do Netflix chamada “Recomeço”. Logo que li o título da obra, enquanto zapeava, pensei: opa, a minha cara! Pois essa palavra é mais que uma palavra. Recomeço é uma expressão da vida, do amor. Ampla como poucas. Está em tudo, e quando pensei que conhecia cada faceta dela, vem essa produção cinematográfica bem feita, cheia de paisagens europeias, de música, de boa comida e de um olhar delicado sobre as relações, e me presenteia com uma face de uso incomum, pelo menos para mim.

Ela não vem após o fim de alguma coisa. Nessa história bonita contada em oito capítulos, recomeço é meio, é durante, é travessia diária, é um amanhecer qualquer, um acerto de passo. Um olhar, um jantar compartilhado, um passeio, um dia difícil de trabalho e o que fazer dele de forma conectada e deliberada, atenta aos movimentos de si mesma e do que impacta o outro. Não procede de um acontecimento disruptivo como tantos que citamos quando a usamos nas nossas vidas, como se uma linha separasse o que era do que será a partir do recomeçar. Não, não nesse contexto trazido na minissérie. Nesse que reaprendi, que ampliei o uso de uma das minhas palavras prediletas.

Ali, recomeça-se quando se persiste, quando se segue vivendo o mesmo caminho, mais do mesmo, do que se escolheu, do que se propôs a amar, a desbravar. Quando se arruma alternativas novas na mesma coisa, na mesma vida, com o que se tem de fatos, afetos e “diagnósticos”. E confesso que me perguntei várias vezes enquanto assistia cada capítulo, onde estariam seus personagens recomeçando naquela vida em que pouco mudou exceto o que não podemos mudar: o fim. Buscando os recomeços em lugares diferentes dos quais me acostumei a buscar, onde achei que eles viviam, lá no tal marco zero.

Em cada ato da vida a dois, das relações de família com pai, mãe, irmãs, na decisão de como maternar, do que escolher como atividade profissional, de como lidar com a saúde, a prosperidade, a doença e a escassez, estamos sempre recomeçando… Exceto se estivermos vivendo no automático ou em torno do nosso próprio umbigo, é claro.  Amor e recomeço são palavras irmãs, ações do afeto mais nobre de todos, verbos do construir o dia a dia ativamente, com vida, se apropriando.

As histórias de amor como a da Amy e do Lino, a minha e a do meu esposo Leandro e a sua, são comoventes e únicas por serem vividas e dizerem única e exclusivamente a respeito de quem cada um de nós é neste momento. Do que aprendemos que podemos entregar, do que não podemos, e daquilo que descobrimos no caminho que somos capazes, e que eu diria que traz infinitas possibilidades. Um infinito particular, claro, que não se copia, que não se repete, não se compara.

O que nos torna semelhantes, que nos toca na história do outro, que nos emociona, nos leva às lágrimas, me parece ser cada esforço que se transforma em superação daquilo que não nos achávamos capazes de atravessar e que, por amor e convicção naquilo que acreditamos, atravessamos. Nos toca a coragem de persistir por amor. De suportar a vida em seu movimento natural de altos e baixos. Nos comove ver o amor em ação porque nada pode ser mais transformador do que ele. Mesmo o amor que se despede, que tentou de tudo e entendeu que poderia ser outro, se transformar em outro formato, em outra coisa.

Escrevi outro dia sobre o amor e o seu lado exigente. Como tudo, ele tem. E por vezes vivemos na idealização de que ele, quando verdadeiro, é invencível e não dói, flui, o que não é verdade. Olha para a sua vida e as suas relações de amor. Olha para os filhos e me conta em segredo, se não tem partes deles difíceis de amar? Nos pais, nos irmãos, no marido, nos amigos, e até naquela figura que seguimos, amamos e admiramos? Não é razoável que em um mundo no qual temos tantas escolhas, tantos caminhos possíveis, tenhamos que lidar com perdas e ganhos, com o bom e com o ruim, com virtudes e defeitos, com o que é como gostaríamos e reconhecemos, e com o que não é, tudo na mesma pessoa?

Pois assim é o amor e os recomeços que enxergo hoje na maturidade. Os que recomeçam no fim e aqueles se dão no durante e que são tão valiosos quanto. Que depois de litros de lágrimas dispensadas na esteira e esfregadas no braço do sofá com as costas das minhas mãos, frente ao desenho bonito de uma história que poderia ser a minha ou a sua (pois o filme me tocou), pude reconhecer naquela da minissérie e na minha jornada própria. Choro de reconhecimento. Comovido pela beleza do amor e do que ele faz, coisa que sempre acreditei. E que gostaria que mais de nós percebêssemos, sabe? Porque o amor, seja pelo que for, é o que nos move, promove recomeços no meio de uma conversa, de um carinho, de uma briga, de um desafio atravessado junto com o ser amado, independentemente do desfecho.

O amor é uma decisão de vida que cria alternativas, que muda coisas, pessoas e caminhos. É o que nos leva ao crescimento mais genuíno, humano e espiritual. O que nos aproxima da felicidade. Só é preciso se prestar a amar.

Então, se valer a dica, assiste a minissérie… E ame, sem medo dos tropeços, das dificuldades que são do viver. Ele traz lentes otimistas e resilientes para os dias sombrios. Ele salva a gente. E se compartilhado e não abandonado pela nossa fé em nós mesmas e nos outros, salva a nossa família, a nossa comunidade e o mundo todo. 

Começa em casa, convivendo com os desafios e abraçando aqueles que remam o mesmo barco. No final, estamos todos juntos.

Se não der, não será por falta de amor.

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