Essa foto foi de segunda-feira dessa semana, após assistirmos juntas o filme do E.T., a pedido dela. Os manos maiores estavam fazendo churrasco com a turma no vizinho, e nós criamos um programa para a “nossa idade”, já que somos “uma pequena e uma velhinha”, disse ela.

Pois essa mesma noite ela não dormiu de medo. Sonhou, chorou, veio para a minha cama pela primeira vez. Cada um tem a sua e respeitamos essa regra aqui. Mas fiquei horas acolhendo o medo dela, trocando de quarto, de lugar na cama, buscando água, ligando a luz, até que cedi o meu espaço e o Ipad, e deixei ela na companhia da Pepa até adormecer às sete da manhã sobre o meu braço.

Como eu canso nessas ocasiões… Como me custam hoje em dia as noites sem dormir. Como invoco a “Santa das Babás”, das avós, na busca de achar retaguarda para mim nessas horas, mãe exausta das tantas missões que envolvem eles…

Isso é real. Parece choramingo de mãe, e é, mas é também algo profundamente verdadeiro. É importante que possamos honrar o que sentimos. O cansaço de cuidar, de se responsabilizar, de educar, de acolher, de acompanhar não é algo que deve ser calado na gente só porque a vida de todo mundo não é fácil. “Ah, mas a fulana trabalha quatorze horas e ainda faz os temas com o filho e malha! Ah, mas a ciclana tem gêmeos, imagina para ela como é! E ela aguenta!” E assim a gente vai se engasgando nas próprias dores. A gente adora não legitimar o sentimento do outro, mas o pior é quando não legitimamos o sentimento de nós mesmas.

Voltando a mim, o fato é que tem um monte de coisa junto aí. Já não sou mãe jovem, não frente a estrutura padrão das famílias grandes que nos foram referências. Minha mãe, por exemplo, teve a minha irmã menor, temporão, já madura, aos seus trinta de dois anos… Ora bolas, trinta e dois? Imagina o que sobra para mim que tive a minha com quase quarenta? 

Supostamente me faltam suplementos, vitaminas, esse arsenal moderno que a minha mãe não tinha e que hoje parece ser uma solução óbvia para manter-se de pé e com vitalidade na vida. Não tomo nada, então pode ser isso. Supostamente, posso estar entrando na pré-menopausa. Uma hipótese que estou investigando e que justificaria muitos dos meus desconfortos, o que seria um alívio, pois constituiria álibi, e uma surpresa. O meu Covid severo supostamente me deixou mais cansada como sequela, e considerando que trabalho fora, tenho três filhos, lido com a pré-adolescência, com uma pequena de quatro, com um casamento que me ocupa com momentos deliciosos e com uma rotina de casa, exercícios e leituras, tão importantes para mim, sou uma pessoa que dorme quarenta minutos após o almoço até mesmo sentada, o que me ajuda a prosseguir, mas não extingue a sensação de tudo que me impacta, de parecer ser muito para mim.

Pois já diz o ditado que “Deus não nos dá fardos que não podemos carregar”, o que eu complementaria com aqueles que “nós” escolhemos trazer para a nossa jornada. Escolhi ser mãe três vezes. Escolhi ser mãe aos quarenta. Escolhi a família grande, a casa cheia e em meio disso trabalhar fora, escrever, ler, me exercitar e namorar. Escolhi essas coisas e enfrentar que me sinto cansada em algumas fases dessa aventura me parece generoso comigo, até justo, mas também me força a encarar as coisas como elas são, as consequências daquilo que quis para mim. E achar que preciso de babá para atravessar uma noite ruim ou sair de férias me pareceu, de repente, também imaturo e com uma certa isenção de responsabilidade frente à minha realidade escolhida, já que quem quis encher ela de coisas fui eu. 

Naquele momento senti que daria conta e pelo jeito Deus concordou comigo e viabilizou a empreitada. O que me faz pensar que o cansaço é do jogo. Que a gente para nesses dias, descansa, reduz a velocidade no dia seguinte, equilibra, se tira alguma coisa, negocia consigo mesma e segue o baile. Pois “é da vida”. E vai passar, é o que dizem. Dizem também que sentiremos falta disso. E quando fujo da rotina para um voo solo e me dou conta que toda essa bagunça, esse excesso são parte de mim, de quem eu escolhi ser, o cansaço parece tão natural quanto uma gargalhada em uma refeição com eles ou uma trovoada forte na ânsia de que saiam do banho ou recolham as roupas atiradas no quarto.  Natural como a certeza de que eu já não viveria sem cuidar, acompanhar, educar, acolher e amar cada um deles. 

Agarrada na saudade que ainda me falta, o negócio é atravessar sentindo a brisa, parando nos refúgios e enfrentando o que é meu. Há felicidade nisso. Há cansaço na felicidade. Há gozo no cansaço. Há o outro dia, a negociação, o recomeço. Há vida nisso. Só não precisamos ignorar o fato de que até o que é bom, cansa:)

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